A luta feminina e a participação da mulher no espaço sindical

A partir da realidade da movimentação das mulheres do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Mojuí que na lida da terra e no enfrentamento às adversidades modificam sua realidade.

22/03/2023 às 14h20 Atualizada em 29/03/2023 às 11h02
Por: Marta Silva Fonte: Tapajós de Fato
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Março é um mês representativo para a luta feminina. No entanto, desmistificar o aspecto romântico imposto para esse período e politizar ainda mais essa data é papel de todas e todos. Nesse sentido, nós do Tapajós de Fato escolhemos histórias de luta a serem trazidas à luz da sociedade, a fim de exemplificar o que representa para a história, as batalhas e a atuação feminina em muitas esferas. 

 

Uma dessas histórias é a participação das mulheres e sua organização na luta sindical. A título de exemplo, tomamos como base a organização das trabalhadoras e agricultoras rurais que fazem parte da luta sindical do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais - STTR de Mojuí dos Campos.

 

Hoje presidido por uma mulher, o STTR em Mojuí possui uma história de independência recente. Antes ligado ao STTR de Santarém, o mesmo foi desmembrado em decorrência da emancipação da Vila de Mojuí dos Campos a título de município em 2012. Logo, a organização precisou se readequar. 

 

No entanto, a participação das mulheres nessa instituição não possui uma história recente, muito pelo contrário, Mojuí possui matriarcas com anos de participação e atuação na luta.

 

Uma dessas mulheres, a produtora rural Maria Mota, moradora da comunidade de Rio Mojú - apontada pela maioria das mulheres como um exemplo de luta e engajamento feminino dentro da organização - pontua a evolução do papel feminino dentro do sindicato, resultante da efetiva participação das mulheres nas ações promovidas.

 

Maria Mota, agricultora familiar/ foto Tapajós de Fato

 

Dona Maria Mota, hoje com quase 80 anos de vida, está na mobilização coletiva desde o início da luta sindical na região. Ela pontua que “no início, quando o movimento era mais movimentado por homens as mulheres ficavam mais na cozinha, mas graças a Deus, com a revolução que a gente teve, com a nossa luta, nós conseguimos um bom espaço… agora a luta não é só dos homens… as mulheres têm dado uma força muito grande”, relata.

 

A fala de dona Maria exemplifica bem o papel, antes, imposto  para as mulheres: a função de apoio e de cuidado. Hoje, no entanto, em Mojuí, as mulheres estão na militância, tomando a frente de projetos de captação de recursos, se organizando para fortalecer suas produções, enfrentando as políticas de desmonte da agricultura familiar e atuando, como protagonistas, na luta ao combate à propagação das monoculturas de soja e milho, que estão invadindo o território. 

 

Um exemplo emblemático da importância e da relevância da participação feminina na organização sindical em Mojuí é a sua coordenação atual. Composta em sua maioria por mulheres, e tendo como figura emblemática a primeira mulher à frente da organização desde a sua implantação no município, a coordenação é vista por muitas mulheres como um exemplo a ser seguido e inspiração para a juventude.

 

Terezinha de Lima, coordenadora de base do sindicato há mais de oito anos, produtora rural, moradora da comunidade Igarapé da Pedra, relata a importância do “movimento sindicalista” e pontua que a participação efetiva das mulheres na luta “deu um grande desenvolvimento para nós [mulheres]...o sindicato é fonte de apoio”. 

 

Ao longo do tempo é nítido a busca por reconhecimento das desigualdades na relação homem e mulher como uma injustiça social. Nesse sentido, a crescente participação feminina na atividade sindical de forma mais pontual e demarcando o seu protagonismo, garantiu uma evolução nesses espaços. 

Parte da diretoria atual do STTR Mojuí, composta em sua maioria por mulheres/ Foto arquivo pessoal

 

A partir desse processo de mudança, nas centrais sindicais, surgem comissões e secretarias específicas para discutir a questão de gênero. Aspecto fundamental para se repensar o machismo e a xenofobia nesses espaços coletivos. 

 

No STTR de Mojuí esse processo não foi diferente. Dona Maria Mota gosta de relembrar do tempo “em que a mulher nem podia se filiar ao sindicato”, uma vez que a sua força de trabalho na terra não era reconhecida. Citar o passado é uma forma de demonstrar as importantes mudanças, resultado de lutas, ocorridas ao longo da história, bem como, demarcar o espaço feminino. 

 

No entanto, mesmo com as mudanças e evoluções dentro das organizações, Terezinha de Lima lamenta que um quantitativo significativo de mulheres, que atuam na agricultura familiar no município, ainda não se comprometam realmente com a luta. “Tem delas [mulheres] que querem entrar [na luta] mas têm medo”, relata.

 

Diante do avanço das monoculturas que afetam principalmente a atividade das produtoras rurais, uma vez que na região há um número expressivo de mulheres (mães solos) provedoras da família por meio de sua atividade de produção na terra, é compreensível o amedrontamento e o receio de muitas.

 

Maria Solange Maia de Lima, agricultora familiar há quase 30 anos, com quinze anos de atuação no sindicato, pontua a “constância” da atuação feminina em Mojuí; elenca a parceria entre o STTR e a cooperativa, composta exclusivamente por mulheres, as Flores do Campos, visando o fortalecimento da produção e do retorno financeiro as trabalhadoras. 

 

“Eu era sindicalizada lá por Santarém e passei para cá [Mojuí], aqui as mulheres participam bastante, elas se reúnem né… nós temos a nossa associação Flores do Campo, que é também uma coisa muito boa para trazer benefícios né”, relata.

 

A agricultora pontua, também que, “estamos [as mulheres] na luta em prol de melhorias para as mulheres, e não só para as mulheres, para os homens também, porque quando a mulher luta toda a família é beneficiada”.

 

E finaliza enfatizando o quanto é “muito, muito gratificante vê que a mulher está ocupando seu lugar no espaço, que antes era só o homem que podia”.

 

Dona Maria Mota exalta a presença de mulheres em posições de destaque na política e pontua o quanto isso é importante para o momento atual e o quanto é inspiração para as futuras gerações.

 

Dona Maria Solange, produtora rural / Foto Tapajós de Fato

 

No mesmo caminho, dona Maria Solange enfatiza a atuação das mulheres que estão hoje no sindicato, fazendo a luta em prol da manutenção das famílias na terra, o enfrentamento às monoculturas e denunciando o uso desordenado de agrotóxicos que vêm causando prejuízos à produção da região e causando doenças, é importante para inspirar as suas filhas [de todas as mulheres] e as jovens meninas das gerações futuras. 

 

 

Nesse sentido, é preciso que seja dada legitimidade e atenção a este ponto central do sindicalismo - o protagonismo feminino - tendo em vista que as mulheres constituem a metade dos trabalhadores sindicalizados no Brasil e suas demandas merecem assumir protagonismos nos sindicatos para fortalecer a política no país.

 

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