A equipe do Tapajós de Fato esteve na ocupação Boa Fé, na manhã desta segunda-feira (10), para acompanhar a situação dos moradores após sofrerem reintegração de posse tendo casas destruídas por máquinas e a grande força policial.
Localizada na Rua Raimundo Xavier Maracana ll, a ocupação Boa Fé tinha cerca de 350 famílias. A ocupação começou há cerca de 1 ano e 8 meses e vinha sofrendo várias tentativas de reintegração de posse
A ação realizada de forma cruel tinha cerca de 150 policiais e ainda militares da Rotam de Belém, Semas do estado e Conselho Tutelar, e ainda nossa equipe também observou a presença de carros da prefeitura municipal, com a presença do diretor de fiscalização da prefeitura que estava de pés e braço cruzado só observando os tratores passando por cima das casas e até mesmo de animais. Pois 3 cachorros foram mortos soterrados sem nenhuma chance de se defender.
Segundo o Tenente-Coronel do 2 BME, Wilton Chaves, em entrevista a equipe do Tapajós de Fato, diz que “hoje todos os barracos foram vistoriado antes da ação, para ver se tinha gente dentro das casas ou animais, tanto que na primeira casa tinha uma criação de patos, fomos lá e dono retirou os patos de la”.
Quando perguntado sobre o caso das mortes de animais (Cachorro), em tom de ironia o Tenente responde: "Ah, cachorro não! Ainda mais a gente que adora cachorro a gente não ia deixar um cachorro lá, não negativo”.
Outro policial que estava ao lado do tenente comentou a seguinte frase à nossa equipe, "vocês identificaram o dono do cachorro ". A repórter disse que "sim", que a dona do cachorro estava chorando, então ele respondeu o seguinte “questiona ela, abandono de aninal”.
Era nítido que os agentes policiais estavam brincando com a situação em que os moradores estavam passando no momento, e tiveram ainda coragem de colocar a culpa nas famílias do local, que no momento estavam sem saber o que fazer.
Animal soterrado na reintegracao / Foto: Ong União Animal
Já houve uma tentativa de reintegração no dia 22 de dezembro do ano passado, há poucos dias do natal. Um grupo de cerca de 40 homens, 3 estavam armados, cercaram as imediações da ocupação exigindo a retirada dos moradores. Eles contavam com três tratores e duas caçambas para derrubar as casas construídas no local, e não possuíam nenhuma documentação para realizar a ação. O Tapajós de Fato também acompanhou de perto essa situação e publicou sobre o fato no portal.
Os moradores resistiram a várias tentativas de retirada, porém na manhã desta segunda-feira (10), um dia após celebração da páscoa, do "Cristo ressuscitado”, o que a equipe do Tapajós do Fato presenciou foram cenas de desalento e angústia das mais de 300 famílias que vivem na luta por moradia em Santarém.
Cavalaria da Polícia / Foto: Tapajós de Fato
A equipe do Tapajós de Fato foi até o local e conversou com moradores que estavam sem saber o que fazer. Crianças, mulheres, com objetos todos no chão, e ainda uma forte chuva fazia com que os moradores se colocassem debaixo de lonas para se protegerem.
O morador Paulo José conversou com a nossa equipe sobre a reintegração de posse, “eles chegaram derrubando, colocando spray de pimenta, ameaçaram a gente que ia meter bala em nós, a gente tá aqui porque precisa de um lugar pra morar, se a gente sair daqui vamos pra onde, olha só eles têm suas casas, e triste a gente passar por isso, a gente já investiu em nosso barraco, e chega uma hora eles vêm derrubar, eu tô com uma mulher grávida, nos não temos condição de pagar um aluguel, aluguel tá caro, e nós não temos condições”.
Segundo o morador, o local era usado para jogar lixo antes da ocupação, já tinham encontrado até mesmo restos de corpos de pessoas mortas. “Isso aqui era um lixão, depois que a gente veio pra parou de ser um local de esconderijo de pessoas, depois que nós ocupamos aqui acabou isso”.
Outra moradora relata sobre como eles estão sozinhos nessa luta por terra e moradia. “Todo mundo nos abandona, ninguém veio pra dar uma força pra gente, então a gente precisava muito da presença deles, da presença deles aqui, daqueles que dizem que são nossos represetantes”.
Casas demolidas na ocupação / Foto: Tapajós de Fato
A Constituição Federal em seu artigo 5º fala o seguinte: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
“A moradia ela é muito importante pra uma pessoa, tanto os ricos como os pobres, e a gente precisa de um pedacinho de chão para sobreviver, cadê os vereadores, será que eles não tão vendo essa situação, eu estou aqui nestes sete meses, só queremos um lugar para morar e criar os filhos e abrigar nossa família, eles chegaram aqui nos desrespeitando, sem uma ordem em mãos, não foi entregue para nem uma liderança a ordem judicial, a polícia é nosso inimigo”, diz a moradora que preferiu não se identificar.
Tratores destruindo as moradias / Foto: Tapajós de Fato
“O que a gente sente é injustiça, não temos voz, nem vez, porque em nenhum momento nenhuma autoridade veio até aqui, cadê o senhor Nélio Aguiar, nunca veio aqui, já que nós não temos direito nesta terra, já que eles falam que são poucas famílias, porque eles não colocaram famílias em outro canto, porque eles não colocaram outro lugar. A gente tá aqui na rua, já choveu, que direito, que humanidade, é isso que a gente tem como justiça, cadê a justiça? A justiça é só pra quem tem dinheiro, porque o que acontece com a gente, é que justiça só pra quem tem dinheiro, para os mais humildes nunca tem, a gente vê tantas injustiças e eu nem sei o que eu vou fazer”, finaliza a moradora que não conseguiu terminar a entrevista, pois estava chorando muito.
Esse triste episódio é o retrato de como o poder público trata a população que mais precisa de seu apoio. Enquanto os que possuem dinheiro parecem fazer o que querem sem sofrerem as consequências, os mais necessitados têm suas casas destruídas e vidas impactadas sem ao menos contarem com o mínimo de ajuda. Até quando?