Maternidade e militância: mães também são seres políticos e têm importância nas lutas

A jornada dupla, tripla ou até mesmo múltiplas enfrentadas pelas mulheres que também são mães é um desafio significativo e uma realidade que muitas mulheres enfrentam diariamente.

11/07/2023 às 11h35 Atualizada em 10/02/2024 às 00h09
Por: Adrielly Pantoja Fonte: Tapajós de Fato
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Lucy e suas filhas / Foto: arquivo pessoal
Lucy e suas filhas / Foto: arquivo pessoal

Conciliar a maternidade com outras tarefas acaba muitas vezes causando um grande desgaste físico e mental nas mulheres. Além de assumirem responsabilidades profissionais ou acadêmicas, elas também desempenham o papel de mães, o que requer tempo, energia e dedicação. 

 

As mulheres muitas vezes se veem divididas entre seus compromissos no trabalho e a necessidade de cuidar e estar presente na vida de seus filhos. No entanto, o desafio mais complexo para as mulheres em jornadas duplas ou triplas é o cuidado dos filhos. Ser mãe exige um alto nível de dedicação e responsabilidade, principalmente quando se é “mãe solo”.

 

Mas para além do mercado de trabalho existem outras atividades, como a própria militância, realidade das mães que estão na luta por direitos, e que muitas vezes não têm essa vivência levada em consideração pela falta de visibilidade.

 

Para dar visibilidade e contar histórias das inúmeras mães da região do Tapajós que conciliam maternidade e militância, o Tapajós de Fato inicia uma série de reportagens para falar sobre essa mulheres que lutam diariamente por um futuro melhor não só para seus filhos, mas para a sociedade como um todo.

 

Lucy Nascimento, por exemplo, de quarenta e três anos, é mãe de duas meninas e é militante do Movimento Tapajós Vivo (MTV) e concilia no seu dia a dia a maternidade e a militância. 

 

Lucy é uma mulher preta formada em serviço social, mas que atualmente está desempregada e, em entrevista ao Tapajós de Fato, ela nos conta que este contexto fez com que ela se interessasse pelo movimento social.

 

“Cansada de ver tantas injustiças eu pensei que não dava mais pra ficar em casa vendo tudo e reclamando sozinha, se for pra morrer que eu morra na luta, e foi isso que eu fiz, entrei em contato com o padre Edilberto Sena e disse ao padre que queria participar de um movimento, de uma organização e aí eu entrei no MTV há três anos”.

 

Lucy Nascimento / Imagem: arquivo pessoal

 

Lucy destaca que é muito difícil conciliar a casa, filhos e a participação dentro da sociedade, “as nossas próprias dificuldades também quanto a questão da gente ser um ser político”, ela pontua e, ainda acrescenta que as mulheres sempre foram afastadas desse contexto mais político, e historicamente foram colocadas para serem mães, esposas com suas atividades voltadas para o trabalho doméstico, os espaços de decisão eram predominantemente ocupados por homens. 

 

“Dentro do MTV eu tive que estar aberta ao novo, a aprender na verdade a andar como uma criança, aprender coisas que antes eu não me interessava, questão de política, questão de economia, a busca da nossa identidade, de quem nós somos dentro do nosso território, a importância da nossa luta”. 

 

Lucy nos conta que ao entrar no MTV seus olhos se abriram para o novo, “e é isso que acontece com muitas mulheres, quando a gente se dá essa chance, essa oportunidade da gente sair do nosso cantinho a gente acaba descobrindo coisas maravilhosas e potencialidades muito grandes em nós mesmas”, mas conciliar tudo isso é um desafio muito grande, não só pelo tempo, mas também pelo julgamento.

 

Muitas vezes mulheres são taxadas de “irresponsáveis” quando trabalham ou participam de qualquer atividade fora do ambiente doméstico, realidade essa que Lucy também enfrenta, mas destaca que ela tem ciência de que está fazendo o correto, principalmente porque sua luta hoje trará resultados futuros para suas filhas. “É muito gratificante participar do movimento, das organizações da sociedade civil na qual eu me sinto feliz por estar fazendo o meu papel como cidadã, como um um ser político que busca a sua história, busca a sua identidade, busca os seus direitos”, ressalta Lucy.

 

Movimento Tapajós Vivo que Lucy é integrante / Foto: arquivo Pessoal

 

Especificamente sobre a divisão entre maternidade e militância Lucy, comenta sobre a capacidade das mulheres de conseguirem realizar diversas atividades ao mesmo tempo, além de manter a mente e corpo saudável.

 

“E é isso que eu faço, muitas coisas ao mesmo tempo, ao mesmo tempo que eu cuido de mim, eu faço exercício físico, tenho uma turma de mulheres aqui nos dias de segunda, quarta e sexta, às oito horas da noite, nesse horário eu já não tenho muita coisa pra fazer, então vou exercitar meu corpo, e nos dias de terça e quinta eu também corro com o grupo chamado Papa-légua, a gente corre na cidade e mudei também a questão da minha alimentação porque estava percebendo que estava me alimentando muito mal”.

 

Este autocuidado é extremamente importante, principalmente para quem tem essa rotina diária desgastante, Lucy leva e busca suas filhas todos os dias na escola de bicicleta. Sobre as demais atividades ela nos conta que sua filha mais velha, Sara de 13 anos, já a ajuda bastante e, quando ela precisa viajar, sua tia a auxilia, mas sempre que ela pode, Lucy leva suas filhas, principalmente Luana, que ainda tem 5 anos.

 

“Nas reuniões eu levo a Luana comigo, nos movimentos, ela me acompanha e ela até já diz que é do MTV, já se sente parte dessa luta, já faz parte da vida dela. O meu brechó faz parte de um coletivo chamado Kitanda Preta que é formado por homens e mulheres pretas, alguns são artesãs que fazem brincos, cordões e roupas, roupas afro, sabonetes, então a gente tem bastante coisa na quitanda preta. [...] A gente vai se ajudando coletivamente e a gente tem que se juntar com aqueles que também têm a mesma ideologia, o mesmo pensamento, o mesmo sonho de mundo igualitário, mais justo, mais fraterno”.

 

Brechó da Kitanda Preta / Foto: arquivo Pessoal

 

 

É fundamental que as mulheres busquem apoio em suas redes de suporte, estabeleçam limites realistas, pratiquem o autocuidado e priorizem seu bem-estar. Desta forma será possível progredir em direção a uma sociedade mais justa e equilibrada, onde as mulheres possam realizar seu potencial sem serem sobrecarregadas e discriminadas, Lucy é um exemplo de mulher forte e independente que luta pelo que acredita pensando principalmente no futuro de suas filhas.

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