Nos dias 28 e 29 de agosto, na sede do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras, Agricultores e Agricultoras Rurais de Santarém (STTR), aconteceu o “Seminário de Enfrentamento à violência política: Lideranças mulheres em espaços públicos”. O evento foi promovido pela Terra de Direitos e contou com a participação de aproximadamente 30 mulheres de coletivos e movimentos sociais da região.
Sobre a importância da criação do seminário, o Tapajós de Fato conversou com a assessora jurídica da Terra de Direitos, Selma Corrêa, para quem “O cenário de enfrentamento à violência política nasce como um espaço de debate, fortalecimento de lideranças mulheres que ocupam espaços políticos de transformação social. A presença dessas lideranças mulheres frente aos movimentos e as organizações sociais tem custado muitas vezes a vivência de formas de violência, violência política, violência física, intimidação, criminalização, tentativas de diminuição da representatividade dessas mulheres. Então, esse seminário tem como objetivo, para além de promover importantes trocas entre lideranças indígenas, quilombolas, agricultoras, pescadoras, defensoras de direitos humanos, realizar também o fortalecimento dessas mulheres, das próprias organizações, e construir juntos encaminhamentos práticos para o enfrentamento da violência, buscando medidas junto ao estado, junto à sociedade e junto às organizações”.
No dia 28, o seminário iniciou com a mesa - composta pela promotora de justiça Lilian Braga, Gisele Barbieri e Auricélia Arapiun - que discutiu o tema “Qualificação e enfrentamento à violência política contra a mulher”, debatendo sobre a importância de as mulheres ocuparem espaços políticos e se fortalecerem dentro deles, para que as mulheres não apenas cheguem ao espaço, mas também para que possam permanecer nele. Na ocasião, mulheres que tombaram na luta foram homenageadas.
O Tapajós de Fato ouviu também Gisele Barbieri, Coordenadora de Incidência Política da Terra de Direitos, que trouxe um panorama mais geral da violência política sofrida por mulheres. Ela acredita que a mesa de debate foi uma troca de informações, pois a Terra de Direitos tem muitos dados resultantes de investigações sobre o tema. A Terra de Direitos trabalha pautada em pesquisas sobre violência política, principalmente no último pleito eleitoral, e, de acordo com o que foi observado no estudo, esse tipo de violência ultrapassou os limites do período eleitoral, em que se notou uma intensificação, virando uma violência cotidiana.
Gisele destaca, ainda, que o momento de troca com as mulheres que participaram do debate foi muito importante, pois “pelos relatos das mulheres que foram trazidos, a gente percebe isso, que [as mulheres] estão expostas a uma violência cotidiana, que é necessário uma organização dessas mulheres, principalmente para estar nos espaços, porque há também outros relatos que a gente ouviu, de pessoas que já estiveram concorrendo a mandatos, que já estiveram dentro do sistema político e que não querem mais essa experiência. Porque foram submetidas a uma violência tão grande, não querem mais estar nesses ambientes”.
Após o encerramento da mesa da manhã do dia 28, as mulheres seguiram com a programação da tarde, que trouxe a mesa sobre “Mulheres em espaços políticos e de transformação social” e que contou com a presença de Maria Ivete Bastos (STTR), Keyla Couto (MALUNGU), Joelma Oliveira (MAB), Isabelle Maciel (TdF) e Miriane Coelho (FOQS), que debateram sobre como é estar nesses espaços de construção e como enfrentam a violência sofrida nas organizações.
Em um momento de compartilhamento de suas trajetórias, Ivete Bastos, presidente do STTR, relatou que não é fácil ocupar esse lugar; Isabelle Maciel, do Tapajós de Fato, comentou que o Brasil, num panorama geral, não é feito para mulheres e que a história das mulheres é feita de conquistas para trabalhar, para sair de casa, para estudar e para se empoderar de autonomia do próprio corpo, que, por vezes, o estado quer dominar.
Após a mesa, foi dado início aos grupos de trabalhos para a construção da carta de enfrentamento a violência política contra as mulheres. As mulheres foram separadas em três grupos, nos quais discutiram estratégias para o enfrentamento à violência e onde puderam compartilhar suas histórias.
No dia 29, a programação seguiu com a leitura das propostas para a carta de enfrentamento à violência política. Na oportunidade, os grupos de trabalho trouxeram as propostas para fortalecer a política de apoio às mulheres principalmente dentro das organizações e do território/distrito de atuação.
Após a leitura das propostas de cada grupo, foi construída a carta em conjunto com as organizações presentes. As seguintes organizações assinaram o documento: Terra de Direitos, Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), Federação das Associações Agroextrativistas do Assentamento PAE Lago Grande (FEAGLE), Instituto Kabu, Federação das Organizações Quilombolas de Santarém (FOQS), Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santarém (STTR/STM), Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), Coordenação das Associações de Remanescentes de Quilombo do Pará (Malungu), Departamento de Mulheres do Conselho Indígena Tapajós e Arapiuns (CITA), Associação das Mulheres Trabalhadoras Rurais (AMTR), Coletivo de Mulheres - Flores do Campo, STTR/Mojuí dos Campos, Coletivo Guardiões do Bem Viver, Associação de Mulheres de Belterra (AMABELA), Tapajós de Fato (TDF), Movimento Tapajós Vivo (MTV) e o Núcleo de Assessoria Jurídica Popular (NAJUP Cabano).
Seguindo a programação do dia 29, durante a tarde ocorreu a mesa “Mulheres e Mudanças Climáticas: Que relação é essa?”. As convidadas para o debate foram Érica Monteiro (Malungu) e Marcela Vecchione (professora da UFPA).
Durante o debate sobre mudanças climáticas, a participação foi fundamental para entender como essas alterações vêm afetando as mulheres dentro do território e como os governos vêm se apropriando do debate sem dar espaços para quem é realmente afetado pelas mudanças climáticas falar em espaços importantes como a COP.
O evento foi encerrado com uma roda de carimbó entre as participantes do evento; então, a carta foi entregue para as representantes de cada organização presente.
O seminário de enfrentamento à violência política contra as mulheres, foi o pontapé inicial para que se criem e se fortaleçam núcleos de apoio às mulheres vítimas de violência política. Além disso, como o debate revelou que a jornada das mulheres para a permanência em espaços de poder é uma batalha muito maior, a carta criada durante o seminário trouxe pontos importantes para que seja possível criar espaços que fortaleçam as mulheres.