Na manhã de hoje, 15 de dezembro, cerca de 100 indígenas dos povos Munduruku, Apiaká e Kayapó protestaram em frente ao Centro de Eventos Scremin, em Novo Progresso (PA), onde estava ocorrendo o “Encontro Regional de Mobilização em Prol da Ferrogrão”. O evento, idealizado pelo senador Zequinha Marinho (Podemos), visava discutir a implementação da linha férrea que visa ligar os estados do Pará e Mato Grosso. Contudo, para que isso ocorra, estima-se que mais de 2 mil quilômetros de floresta amazônica sejam desmatados, impactando áreas de conservação e 16 territórios indígenas.
Os indígenas chegaram em frente ao local do evento às 9h, com faixas denunciando os impactos do projeto e da necessidade de cumprir os protocolos de consulta, com mensagens como: “Ferrogrão é a destruição da floresta e dos povos indígenas”; “Ferrogrão não é boa para o povo! Só para Cargill, Bunge, ADM, Dreyfus, etc”; “Trilho que terá sangue indígena”; “Vozes do povo Apiaká do Médio Tapajós exigem respeito ao protocolo de consulta”.
“Um dia depois da derrubada dos vetos ao Marco Temporal, este evento tenta legitimar um projeto que coloca em risco os povos da Amazônia e a própria floresta. Ele atropela os nossos direitos. Não ocorreu a consulta segundo os protocolos de cada povo, conforme estabelece a convenção 169 da OIT. Eles discutem destruir as nossas terras e não falam com a gente. Falam de megaprojetos, mas não falam de demarcação. Quem lucra com isso não é o povo, são as grandes empresas como a Cargill, Bunge, ADM, Dreyfus, etc. Estamos aqui protestando, porque a nossa preocupação é que sigam discutindo este projeto deixando os povos indígenas de lado”, afirma a liderança índigena Alessandra Munduruku.
Em um momento em que se discute a conservação da Amazônia e das florestas como saída para evitar o aquecimento global e a mudança climática, o projeto vai na contramão de todo esforço que lideranças sociais e políticas têm despendido para evitar um colapso socioambiental.
“A Ferrogrão é um projeto sem viabilidade, que ignora alternativas logísticas, e ameaça não apenas a Amazônia e seus povos, mas o futuro de toda a humanidade”, afirma Pedro Charbel, assessor de campanhas da Amazon Watch, “Já passou da hora das comunidades tradicionais e povos indígenas afetados serem consultados, é vergonhoso e ilegal que isso ainda não tenha acontecido. O simples anúncio do projeto da Ferrogrão já agravou as pressões e violações nos territórios.”
A Ferrogrão está acoplada a um projeto de infraestrutura maior chamado Corredor Logístico Tapajós-Xingu, que inclui ainda a pavimentação da rodovia BR-163, hidrovias e a construção de terminais de carga. Dados da PUC-Rio e Climate Policy Initiative estimam que, caso não seja efetiva a mitigação dos problemas derivados do projeto, haja uma perda equivalente a mais de285.000 campos de futebol de vegetação natural - o que corresponde a emissão de mais de 75 milhões de toneladas de carbono. Além de outros impactos como a diminuição da biodiversidade ou a redução dos serviços ecossistêmicos provenientes do bioma.
A Medida Provisória editada por Temer para viabilizar a Ferrogrão pretendeu excluir cerca de 862 hectares do Parque Nacional do Jamanxim. Este fato ensejou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade do PSOL, a qual conquistou uma liminar que suspendeu o desenvolvimento do projeto em 2021. Em maio de 2023, o Ministro Alexandre de Moraes autorizou a retomada dos estudos sobre a Ferrogrão, os quais foram incluídos no Programa de Aceleramento do Crescimento (PAC) publicado em agosto.