Segunda, 07 de Outubro de 2024
Reportagem Especial Projeto

Ecocentro da Sociobioeconomia: iniciativa sustentável que beneficia agricultores da região Oeste do Pará e inspira um modelo possível para manter a floresta em pé

Na região amazônica as safras dos diversos produtos variam de acordo com o clima e as estações do ano, verão e inverno, que são mais fortemente marcadas nessa região, contudo, com as Mudanças Climáticas esse ciclo vem se modificando, e alguns produtos começam a reduzir e ter menos produção, ainda assim, cada matéria prima tem seu tempo de colheita, e o Ecocentro vai se adaptando de acordo com as demandas.

12/09/2024 às 16h30 Atualizada em 12/09/2024 às 16h36
Por: Conce Gomes Fonte: Tapajós de Fato
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Saúde e Alegria
Saúde e Alegria

A agricultura familiar da região Oeste do Pará vem sofrendo danos causados pelas Mudanças Climáticas, e há décadas as transformações nos ciclos de plantação, colheita e produção se modificam, o que altera e prejudica tanto o sustento básico das populações quanto a comercialização das produções vindas da agricultura familiar rural.

A expansão das fronteiras agrícolas e o desequilíbrio climático causado pelo alto índice de desmatamento para a monocultura da soja e exploração de madeira, dentre outros, tem causado desequilíbrio também nas produções dos agricultores e agricultoras familiares, dessa maneira, o Ecocentro da Sociobioeconomia surge nesse momento importantíssimo como uma grande possibilidade de transformação no processo econômico da região, agregando valor aos produtos e aos trabalhadores e trabalhadores da floresta que contribuem com a manutenção da floresta em pé e amenizando os danos climáticos garantindo qualidade de vida e bem estar às famílias da região Oeste do Pará.

O Ecocentro da Sociobioeconomia está localizado em Santarém, Oeste do Pará, e é um  pólo multiprocessador da ACOSPER- Cooperativa Agroextrativista do Oeste do Pará junto ao STTR- Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais do Oeste do Pará, criado para agregar valor aos produtos da floresta como óleos, mel, borracha, polpas, trançados de palhas, e etc. E a concretização desse sonho que vem da luta dos trabalhadores e trabalhadoras por muitos anos foi possível com o apoio do Fundo Amazônia/ BNDES com recursos de contrapartida de outros parceiros do Projeto Saúde e Alegria.

A proposta  inicial para a criação e idealização do Ecocentro surgiu por volta do ano dois mil (2000), após várias campanhas, e se estendeu por dois mil e treze (2013) à dois mil e dezoito (2018), porém, somente em 2019 surgiu a campanha “Não Abra Mão da Sua Terra”, que ainda não era suficiente para suprir as necessidades e demandas dos agricultores e agricultoras da região, não bastava dizer “Não Abra Mão de sua Terra”, mas ter uma alternativa de, como quem está em sua terra, suas áreas, suas unidades, ter uma renda melhor, uma garantia de venda dos produtos, principalmente nos territórios coletivos onde têm um potencial muito grande dos produtos extrativistas. Em entrevista ao Tapajós de Fato, Ivete Bastos, liderança sindical e agricultora familiar nos conta um pouco mais dessa história de luta e conquista.

Ivete Bastos na inauguração do Ecocentro / Foto: Projeto Saúde e Alegria

“Então foi pensado nesse projeto do Ecocentro para estar estimulando e valorizando a produção extrativa, como a borracha, a andiroba, o cumarú e várias outras essências, como também a semente do cupuaçu e outros derivados da floresta. E o que que acontece nesse momento onde essa essa inauguração se concretizou vem uma esperança ainda muito maior, mesmo com as dificuldades enfrentadas, com a crise climática mas ter inaugurado com a presença de três ministras que vieram e que acreditam que a floresta em pé ainda é a solução do planeta, principalmente pra fazer justiça climática. Então o Ecocentro desempenha um papel muito grande também de alternativa de permanência das pessoas na terra, dos povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e outros, assim como também ele é um gerador de renda, de melhoria da qualidade de vida e da valorização das pessoas que querem viver na terra e acreditar também que ainda é possível viver com a floresta em pé e dela ter renda, ter dignidade contribuindo para justiça climática.”

Administrado pela Acosper, o Ecocentro vai impactar aproximadamente 500 pessoas de forma direta, e o modelo sustentável une tecnologias digitais e ferramentas de saberes tradicionais que possibilitam o movimento da economia verde, gerando renda e melhor qualidade de vida, além da possibilidade de escoar os produtos saudáveis dos territórios para que cheguem à população santarena contribuindo diretamente para manter a floresta em pé e mitigando os efeitos adversos das Mudanças Climáticas.

O Ecocentro está atuando diretamente com trinta e nove (39) comunidades e aldeias, onde a cooperativa tem cooperados e cooperadas, mas a atuação vai além, e o grande objetivo é atender a maior parte de agricultores e agricultoras familiares extrativistas do Oeste do Pará, contudo, ainda não abrange todos os municípios, mas isso já está incluso em projeto futuro. No momento, os municípios que estão trabalhando diretamente junto ao Ecocentro são Belterra, Mojuí dos Campos, Oriximiná e Uruará, e esses já têm matéria prima no Ecocentro para ser beneficiada, como por exemplo, a semente da Andiroba.

Nossa equipe entrevistou Manoel Edivaldo Santos Matos, mais conhecido como Peixe, presidente da Cooperativa dos Trabalhadores Agroextrativista do Oeste do Pará, que coordena o Ecocentro da Sociobioeconomia, que compartilha conosco o objetivo e os caminhos que o Ecocentro vem trilhando construindo estratégias de envolvimento  junto aos produtores locais e cidades vizinhas.

Inauguração do Ecocentro com a presença da Ministra Marina Silva / Foto:Tapajós de Fato

“Então o Ecocentro é abrangente, gradativamente a gente vai poder chegar aos outros lugares, até porque nós já fomos procurados pelos municípios de Alenquer, Prainha, Altamira, entre outros. Mas a gente tem todo um planejamento dentro da nossa estratégia de  produção, de desenvolvimento, pra extração dos óleos ou armazenamento das sementes como o cumaru. Pra isso é necessário a gente ter boas práticas para poder ter um produto final de qualidade. Então esse é o grande objetivo do Ecocentro, e ele vai funcionar ou está funcionando todos os dias, todos os dias está tendo extração de óleo de andiroba, enquanto ele tiver matéria-prima ele vai estar funcionando”.

Na região amazônica as safras dos diversos produtos variam de acordo com o clima e as estações do ano, verão e inverno, que são mais fortemente marcadas nessa região, contudo, com as Mudanças Climáticas esse ciclo vem se modificando, e alguns produtos começam a reduzir e ter menos produção, ainda assim, cada matéria prima tem seu tempo de colheita, e o Ecocentro vai se adaptando de acordo com as demandas.

“Então o Ecocentro tem hoje dentro da nossa estratégia o mel de abelha sem ferrão, está chegando a safra né? Ou seja está encerrando a safra da coleta de sementes, está no processamento pra extração do óleo, aí entra o mel de abelha, agora a gente sabe que não tem muita produção em função do clima mas é o período que chega pra coleta de mel, e depois vem as frutas como cupuaçu, e a gente está com a agroindústria a parte física pronta”. 

O Ecocentro fica aberto para visitação e é importante fazer um agendamento antecipado para falar com as pessoas responsáveis. O projeto é fruto de uma luta histórica do movimento sindical e seus parceiros.

Dentre os parceiros que contribuíram para realizar esse sonho da construção do Ecocentro, um deles é o Projeto Saúde e Alegria, onde o coordenador Caetano Scannavino em entrevista ao Tapajós de Fato fala sobre a parceria com  o STTR e ACOSPER.

Caetano falado na cerimônia de inauguração do Ecocentro / Foto: Projeto Saúde e Alegria

“Estamos muito felizes e sabedores do desafio com o início das operações do Ecocentro. Nossos parabéns também ao STTR e a ACOSPER, que revitalizaram aquele antigo galpão abandonado de borracha. Foi transformado num centro multiprocessador de floresta, com paiol secador de sementes, usina extratora de óleos, destilador de copaíba, casa do mel, entreposto de borracha, despolpadeira de frutas, câmaras frias. Isso depois de todo trabalho iniciado pelo PSA e organizações parceiras através do Programa Floresta Ativa, com ações nas aldeias e comunidades de apoio à produção agroextrativista, com a rede de viveiros, coleta de sementes, restauração florestal, recuperação de áreas degradadas, melhoria dos roçados, principalmente através de sistemas agroflorestais com espécies que tragam mais segurança alimentar e tenham valor de mercado. Agora com o Ecocentro, ao invés da venda “in natura”, está sendo possível beneficiar e agregar valor aos produtos das aldeias e comunidades. E comercializar diretamente, sem atravessadores. É gerar renda, a partir das vocações e culturas do Tapajós, e com a floresta em pé. O óleo de andiroba já está nos sabonetes da Natura, o látex nos tênis da VEJA, e o mel certificado pela ADEPARÁ. É o povo agroextrativista mostrando que é possível um outro tipo de desenvolvimento, pelo bem-viver, para todos hoje e gerações futuras”.

Com a inauguração do Ecocentro, a agricultura familiar da região Oeste do Pará começa a escrever uma nova parte de sua história, uma história de sucesso e esperança que mostra ao mundo a importância de adaptarmos a modernidade à estruturas economicamente sustentáveis e possíveis que beneficiam à todos e ainda contribuem para manter a floresta em pé. A cada dia os trabalhadores e trabalhadoras rurais trabalham enquanto lutam por uma vida digna, justa e sustentável, por políticas públicas e garantindo seu espaço de direito, ocupando esses espaços e fortalecendo a cultura amazônica em meio à natureza.

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