O documentário “AWAYDIP TIP IMUTAXIPI” (Floresta doente), realizado pelo Coletivo Audiovisual Wakoborun, faz sua estreia em Festivais de Cinema no Brasil. O curta foi selecionado para compor a programação do Festival Olhar Film, um evento que busca fortalecer e solidificar a cultura de festivais de cinema na Amazônia. Além disso, foi indicado ao Prêmio Olhar de Melhor Filme Amazônida no Festival.
“A floresta era feliz e todos os habitantes da floresta também eram felizes. Por isso que nós também não iremos parar de lutar em prol da nossa floresta, pois sempre resistimos e iremos continuar resistindo”. Esse é um dos trechos narrados no documentário pelo Coletivo Audiovisual Wakoborun, formado, desde 2018, por jovens do Povo Munduruku, da região do Alto Tapajós.
O documentário, primeira produção de uma série que o Coletivo pretende realizar, traduz uma jornada dos jovens dentro de seu território. Percorrendo diferentes aldeias, escutando lideranças e registrando o cotidiano do seu povo, elas/es denunciam a destruição provocada pelo garimpo: devastação da floresta, violência, poluição dos rios e, consequentemente, dos peixes, aumento significativo de doenças e mortalidade. O Coletivo afirma que “várias pessoas foram afetadas pelo garimpo, principalmente pelo mercúrio, falta de água, comida. O garimpo também trouxe ganância. O garimpeiro “branco” traz informações falsas para nossas comunidades, prometendo condições melhores de vida, mas não é isso que aconteceu, eles só destruíram nossas terras. Queremos contar esta história porque nos preocupamos que muitos jovens e crianças não possam mais viver em suas próprias terras.”
O curta foi realizado de maneira coletiva, com o apoio também de outros Coletivos Audiovisuais do Povo Munduruku (Coletivo Audiovisual Wuyxaximã e Coletivo Audiovisual Da’uk). Além de denunciar os impactos do garimpo, “Floresta doente” também é um chamado ao protagonismo indígena na construção de suas narrativas. “É necessário que a gente utilize também os meios tecnológicos. O audiovisual é muito importante em nossas vidas. Os pariwat (não-indígenas) têm realizado muitos registros sobre nossa situação. Com esse documentário vemos a urgência do nosso próprio povo falar sobre a nossa própria História. É a realidade que vivemos e sentimos todos os dias em nosso território”, declara o Coletivo Wakoborun.
O olhar dos jovens registra a destruição deixada pelo garimpo, sem deixar de passear pelas belezas do povo e do território. Além das entrevistas com lideranças, a narrativa tece um diário sobre o processo de filmagem, em que elas/eles relatam, em primeira pessoa e na língua originária, a visão e o sentimento que têm sobre a invasão de suas terras. A metodologia na realização do curta reflete a própria organização do Povo Munduruku. Desde a construção do roteiro até o processo de edição, as decisões são tomadas em comum, em espaços que cultivam a possibilidade de troca, autonomia e reflexão.
A primeira exibição do documentário foi realizada em uma das aldeias do próprio território, durante Assembleia da Associação das Mulheres Munduruku Wakoborun, no início deste ano. Em maio, representantes do Coletivo apresentaram o curta-metragem em uma agenda de exibição na Europa (Inglaterra, Irlanda e Escócia). As projeções fizeram parte de uma série de atividades junto a uma delegação de populações tradicionais, que têm em comum viverem sob múltiplas pressões e ameaças sobre seus territórios. Em agosto deste ano, o documentário foi exibido em Chicago, Estados Unidos, durante uma conferência que abordou questões críticas com relação ao mercado do ouro.
Povo Munduruku e o garimpo
O Povo Munduruku compõe cerca de 16 mil pessoas, que vivem em ao menos 15 terras indígenas (TIs) em diferentes estágios de demarcação nos estados do Pará, Mato Grosso e Amazonas, na região amazônica. A grande maioria da população se concentra no curso superior do rio Tapajós. A Mundurukânia está ameaçada por inúmeros invasores e se encontra em uma das maiores reservas de ouro do mundo. A Bacia do Tapajós representa a principal área de concentração de garimpos ilegais de ouro da Amazônia Brasileira. A Terra Indígena Munduruku é a segunda Terra Indígena mais afetada com garimpo no Brasil.
Um estudo realizado pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) revelou altos níveis de mercúrio no corpo dos indígenas Munduruku. Na pesquisa, foram analisadas amostras de cabelo e em alguns casos, os níveis de mercúrio estavam duas vezes e até três vezes acima do considerado seguro para a saúde humana pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Somado aos impactos da exploração do garimpo, o Povo Munduruku atualmente tem sofrido com as consequências da extrema seca. A falta de água potável tem impactado diretamente a saúde e sobrevivência da população em diversas aldeias do território.
Para assistir o teaser do filme clique aqui