A situação em que se encontra a Amazônia no ano de 2024 em relação a seca é alarmante, pois diversas populações que dependem dos rios para se locomover, se alimentar e gerar renda para família estão tentando sobreviver à pior seca já vista na história.
Com o avanço destruidor das mudanças climáticas que impactam de diversas formas os territórios amazônicos, a estiagem que anteriormente tinha seu período mais intenso entre os meses de setembro e novembro, agora já inicia no mês de julho, como muitos ribeirinhos têm relatado.
O ano de 2023 e 2024 marcam como a crise climática pode interferir nas dinâmicas da natureza, fazendo com que um acontecimento comum e já esperado como a estiagem na Amazônia, se torne algo extremo e prejudicial para a população.
No município de Monte Alegre, localizado na região oeste do estado do Pará, e banhado pelo rio Gurupatuba, os efeitos da seca extrema já têm impactado no bem viver dos moradores, como a morte de peixes, falta de água e isolamento de comunidades devido a restriç]ao de locomoção pelo rio. Nessa quarta semana do mês de outubro uma situação tem preocupado os moradores da comunidade Aldeia, região do Lago Grande de Monte Alegre, que estão fazendo uma força tarefa para salvar os peixes que se encontram em um lago que secou completamente na comunidade.
Pescadores e comunitários iniciaram no dia 20 de outubro a remoção de peixes que estavam em meio a lama da seca de um lago da comunidade, muitos já agonizando e morrendo, e dentre as espécies retiradas estão o Acari, Pirarucuzinho, Traíra, Caruaçu, entre outros. Durante os trabalhos também foram encontradas diversas arraias mortas.
Ao longo desses 3 dias de trabalho, retirando os peixes e os colocando em outro lago que não está tão seco, os comunitários contabilizaram cerca de 35 mil peixes salvos, onde com o apoio de uma caminhonete do Ideflor e motos de moradores precisaram fazer cerca de 15 viagens por dia para transportar os peixes de um lago para o outro.
Um comunitário relata o quanto tem sido exaustivo e perigoso esse trabalho, “a gente ainda precisa tirar mais, eu acho que dá uns 2.000, porque tem muito ainda, a gente não conseguiu resgatar tudo, foi muito cansativo e arriscado porque tem arraia, todas com ferrão, e a gente chegou no limite que começou 7 horas e foi até meio dia’’.
Essa ação dos comunitários, que já dura 3 dias, vai continuar até que retirem todos os peixes do local, onde seguem sem nenhuma ajuda de governos ou órgãos oficiais. “Essa semente que a gente fez, que ela regue e seja o futuro de amanhã, porque eles são peixes pequenos, mas daqui a pouco estão prontos para reproduzir, a gente espera que o lago que a gente botou não venha a estiagem tão forte, porque se secar vai ser um trabalho de tirar de novo de um canto para morrer, mas eu tenho fé em Deus que não vai secar e vai dar de manter eles vivos”, desabafa o comunitário que tem atuado na ação.
O Conselho Pastoral de Pesca, que é um movimento que tem atuado em prol das comunidades pesqueiras da Amazônia, tem acompanhado de perto as realidades de várias comunidades impactadas com a seca, principalmente na região de Monte Alegre. Renan Luiz, integrante da CPP, comenta sobre a preocupação em relação à situação da comunidade.
“A nossa preocupação enquanto o CPP são são várias né, porque esse processo de de estiagem coloca em risco o trabalho que as comunidades fazem dos acordos de pesca, dos manejos, porque é isso, as comunidades buscam se organizar ali para defender o recurso pesqueiro, e numa situação como essa que os lagos secam completamente, praticamente não há o que fazer. Então uma das nossas preocupações é isso, está em risco um trabalho que as comunidades fazem de conservar e recuperar seus estoque de pesca, e consequentemente isso vai bater na questão da segurança e da soberania alimentar porque as comunidades têm no pescado a principal fonte de alimento”.
Renan destaca ainda a falta de pescado nos próximos anos, pois os peixes que estão morrendo não chegaram a se reproduzir ainda, uma vez que a reprodução da maioria das espécies acontece agora no final da seca para o início da cheia. “Então a gente tem essa preocupação também do que que vai representar essa seca para esses toques de pesqueiros nos próximos anos, também não só agora que já tá fazendo falta mas também nos próximos anos”.
A situação preocupante em que os comunitários da Aldeia estão passando não é isolada, muitas comunidades da Amazônia se encontram assim em estado crítico, sentindo os impactos da seca através da falta de peixes, falta de água e isoladas, tendo que sobreviver por conta própria sem nenhuma ajuda do Estado. Os moradores e pescadores de Monte Alegre vão seguir nessa força tarefa até que todos os peixes sejam salvos, preservando o bem viver coletivo e como eles mesmo afirmam “plantando essa semente para o futuro”.