COP 30: como organizações amazônidas estão se movimentando para incidir no maior evento climático internacional que será sediado na capital do estado do Pará, Belém

Nesse cenário de COP-30 se faz necessário e importante as mobilizações dos movimentos e organizações para que se possa incidir nos processos políticos de decisão no que permeia a vida de toda a população amazônica, nacional e mundial nesse contexto de proteção, preservação ambiental em meio à Crise Climática agravada a cada dia onde processos de mitigação são meios de ser efetivamente concretizados mediante os acordos assumidos no evento internacional da Conferência das Partes- COP.

04/11/2024 às 14h51
Por: Conce Gomes Fonte: Tapajós de Fato
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 Foto/ COP 1, Berlim (1995)- reprodução da internet
Foto/ COP 1, Berlim (1995)- reprodução da internet

A COP é a sigla que define a “Conferência das Partes”, um evento global que reúne líderes, autoridades e representantes das nações de todo o mundo para discutir e tomar medidas sobre as questões climáticas. A conferência funciona também como um fórum importante para negociação de acordos e definir estratégias para lidar com as questões ambientais. A primeira COP aconteceu em Berlim no ano de 1995.

Este ano acontecerá a 29ª COP, em Baku, capital do Azerbaijão e posterior, em 2025, a COP- 30 acontecerá na capital paraense, Belém, e já este ano acontece a mobilização das organizações para incidir no evento sobre as pautas climáticas, e principalmente, sobre a Amazônia. 

Nesse cenário de COP-30 se faz necessário e importante as mobilizações dos movimentos e organizações para que se possa incidir nos processos políticos de decisão no que permeia a vida de toda a população amazônica, nacional e mundial nesse contexto de proteção, preservação ambiental em meio à Crise Climática agravada a cada dia onde processos de mitigação são meios de ser efetivamente concretizados mediante os acordos assumidos no evento internacional da Conferência das Partes- COP.

Dentre essas mobilizações coletivas, construiu- se o Comitê COP- 30, que é a mobilização de organizações latino americanas que têm debatido sobre a agenda da importância da realização da COP- 30 em Belém a partir de quatro eixos que visam a incidência dessas organizações para uma COP centrada em uma perspectiva socioambiental. O Comitê é composto por 36 organizações e dividido em quatro GT’s- Grupos de Trabalho.

Foto/ Comitê COP- 30

Dentro dessa estrutura, os quatro grupos de trabalho são: GT de Negociação, que são as demandas de negociação onde se debate como que tais negociações impactam a vida das pessoas; GT de NDCs que são Contribuições Nacionalmente Determinadas, estabelecidas a partir do acordo de Paris e que serão readequadas a partir da COP de Belém; GT de Infraestrutura e Cuidado que tem debatido os impactos das obras, dos impactos socioambientais dessas obras e das construções que têm sido feitas para a COP- 30 além do debate amplo sobre como existe um lugar de segurança que atravessa os contextos sociais e que precisa ser resguardado e GT de Comunicação que debate como se pode comunicar isso para a sociedade.

Em entrevista ao Tapajós de Fato, o Assessor Político e Institucional do Comitê COP-30, Marcos Wesley Pedroso, compartilhou sobre a importância dessa estrutura de mobilização. “Então o Comitê COP- 30 é um pouco dessa grande mobilização de organizações que têm essa atuação na agenda climática e socioambiental, pra gente debater a importância da COP e o seu legado pras vidas amazônidas, debater as principais estratégias e documentos a serem propostos para essa agenda e a partir disso como é que a gente traz esse debate pra que a gente tenha faça cada vez mais plural, descentralizado e que de fato contemple nossas vidas, as nossas agendas que são cotidianamente afetadas pela a crise climática”.

Outra organização que também se movimenta para incidir na COP- 30 é a FETAGRI- Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Pará, uma organização da sociedade civil que está em 142 municípios, com 142 sindicatos e em dez regionais no estado e sua administração se dá em paridade.

Em entrevista ao Tapajós de Fato sobre a organização, Angela de Jesus, presidente da FETAGRI, fala um pouco sobre perspectivas para a COP 30.

“Em relação a COP- 30 nós decidimos que nós íamos primeiro trabalhar a questão da formação. Então nós temos a Escola Nacional de Formação que é a Enfoque e nós temos o itinerário formativo, nós temos a matriz pedagógica e dentro da nossa matriz pedagógica um dos eixos temáticos, além de outros, é a COP- 30 Para que as pessoas possam compreender o que é a Conferência das Partes. A nossa incidência tem se dado na organização e na discussão com outras organizações, porque a FETAGRi sozinha é impossível. Nós temos conversado a partir da cúpula dos povos, já teve uma reunião aqui no estado do Pará, vai ter outra em Brasília pra gente dialogar um pouco as outras organizações, as frentes feministas, MAB, MST e outras organizações da sociedade civil pra gente elaborar uma estratégia, como que nós vamos estar nos posicionando durante o evento, antes, durante e depois porque isso é importante”.

Foto/ Arquivo pessoal

A Agricultura Familiar no Brasil está presente nos cinco biomas brasileiros e é a oitava maior produtora de alimento do mundo, garantindo a segurança alimentar e nutricional da população. Com o agravamento das Mudanças Climáticas nos deixando em estado de Crise Climática onde se fazem urgente ações na mitigação e processos que possam de alguma maneira reverter ou amenizar o clima, a produção proveniente da agricultura familiar fica severamente comprometida colocando em risco mundial a segurança alimentar, tendo em vista que as propriedades de agricultura familiar somam 3,9 milhões, somente no Brasil, representando 77% de todos os estabelecimentos agrícolas, segundo dados do IBGE. 

A falta de acesso a crédito, a falta de tecnologias adaptadas às realidades dos agricultores familiares e falta de mercado para seus produtos se encontram entre os desafios enfrentados pelos agricultores. E um agravante para a agricultura familiar, bem como para o clima, é o uso de agrotóxicos e a monocultura em grandes propriedades, prejudicando assim as plantações agroecológicas, a segurança alimentar e causando desequilíbrio nos biomas e causando danos ao meio ambiente e às famílias produtoras.

A FETAGRI também vem dialogando com as secretarias de governo a respeito da agricultura familiar na COP, como por exemplo, o que a Agricultura Familiar vai ter de legado dessa COP? Qual tipo de alimentação será utilizada na COP? 

“Por exemplo, a alimentação que vai ser utilizada durante a COP, vai ser da agroecologia? Vai ser da agricultura familiar? Ou não vai ser? Vai ter feira pra Amazônia? Para o estado do Pará? Todos esses questionamentos nós estamos fazendo pra SEAF que é a Secretaria Estadual da Agricultura Familiar, pra SEMA que é a Secretaria de Meio Ambiente e pra outras secretarias de governo. Então nós estamos nessa caminhada,mas se somando a outras organizações”, pontua Angela de Jesus.

A COP- 30 tem fundamental importância, tendo em vista que seu principal objetivo é a elaboração do documento que prevê a adoção da meta 30x30, que propõe garantir a conservação efetiva de 30% das terras, mares e águas doce do mundo, e condições para a mobilização de recursos até 2030.

A conferência também oferece uma plataforma para que o Brasil lidere comprometimento com políticas ambientais fortes e se conecte em fortalecimento com cooperações internacionais na proteção e preservação do bioma amazônico que é muito importante para todo o mundo e um dos mais importantes do planeta. 

Dentre as organizações que se mobilizam para a COP- 30, está a Malungu, que é a organização das associações quilombolas de diversas regiões do Pará e que representa as mais de 500 comunidades quilombolas paraenses nos planos estadual e nacional, e luta pela garantia dos direitos e pelo reconhecimento social dos quilombolas.

Segundo dados que fazem parte de mais um suplemento do Censo 2022, divulgados pelo IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística em Julho de 2024, a população quilombola no país era formada por 7.666 comunidades que habitavam 8.441 localidades em 25 Unidades da Federação. Esse conjunto soma 1,3 milhão de pessoas, e quase 90% dos quilombos ainda vivem em territórios não titulados. Dessa maneira, a titularização das terras se mostra essencial na manutenção das florestas, reconhecimento dos povos e territórios quilombolas, e consequentemente, contribui positivamente na luta por justiça climática, que é pauta central da COP- 30.

No Pará, segundo dados do Iterpa- Instituto de Terras do Pará, em 2022 eram 125 áreas de remanescentes de quilombos, com 62 tituladas.

A Malungu, atualmente possui seis coordenações e cinco regionais e a coordenação geral que transita nas bases, e surgiu da necessidade das comunidades articularem de forma mais direta com o governo do estado a garantia de direitos dessas comunidades, direito à educação, saúde, direito de terras, principalmente regularização fundiária dos territórios quilombolas e titulação desses territórios, e em especial dar voz a essas comunidades que estavam isoladas na região do Baixo Amazonas. Dentro da Malungu existe o Projeto “Aquilombar”, o maior projeto exclusivo na atuação direta na questão fundiária junto ao Estado e a todos os órgãos competentes que são responsáveis em regularizar esses territórios.

Quem nos cedeu entrevista foi Carlene Printes, que é do quilombo Boa Vista Trombetas, de Oriximiná, que é o primeiro quilombo titulado coletivamente no país. Carlene Printes é coordenadora de Diversidade de Gênero na Malungu e conselheira da Promoção de Igualdade Racial, e também coordenadora da ARQMO que é a Associação Remanescente de Quilombos das comunidades quilombolas de Oriximiná. 

“Entendendo a importância, a gente instituiu um comitê que a gente chamou comitê COP, né? Que é justamente para dialogar, articular, pensar, estudar como que nós podemos fazer essa incidência na COP, sabe, a gente está se organizando internamente, entendendo e buscando como que a gente consegue fazer essa incidência e principalmente fazer com que o nosso povo também possa aparecer neste cenário”.

 

Foto/ Arquivo pessoal

Dentro desse contexto,  a organização das mulheres negras quilombolas em seu décimo primeiro encontro, que foi realizado no Quilombo Murumuru na região de Santarém, Oeste do Pará, discutiu sobre questões climáticas e sobre a incidência dessas mulheres na COP- 30 na busca de estratégias para chegar ao evento, como apoio financeiro, e mostrar que aqui nesta Amazônia existem mulheres quilombolas que defendem esses territórios na luta diária para que a floresta se mantenha de pé, e a organização Malungu vê essa possibilidade de discussão e incidência a partir da COP- 30 que é a primeira na Amazônia.

“Então a gente vê a conferência como uma chance de fortalecer alianças com os outros movimentos sociais, organizações internacionais e governos. A conferência é onde se debate o clima e as pessoas que estão dentro das florestas da Amazônia, são as pessoas que ficam fora desse debate. Grandes poderosos, ricos, sentam na mesa para negociar e nós que estamos ali na ponta não participamos disso. Reforçar a importância da consulta livre, prévia e informada e apresentar propostas de manejo sustentável dos recursos que existem nos nossos territórios, dos recursos naturais e principalmente inserir, fazer reconhecer, que o conhecimento ancestral precisa ser levado em consideração como parte da solução para essa crise climática".

Dessa maneira, a COP será uma forma de ampliar e ecoar as vozes da comunidade quilombola, de sua resistência e principalmente reforçar o protagonismo dos povos da Amazônia na defesa do clima, dos direitos humanos. A Malungu se organiza para pressionar o governo, principalmente por políticas públicas que garantam a titulação das terras, a proteção dos territórios quilombolas e a inclusão dos quilombolas nos processos de tomada de decisão relacionados ao clima, mostrando que a luta contra a crise climática é também uma luta por justiça social e reconhecimento principalmente dos direitos territoriais dos quilombolas.

A luta pelo reconhecimento se estende tanto ao povo quilombola quanto aos indígenas. Aos povos indígenas, a demarcação de terras garante o direito à terra, bem como preservar sua identidade, evitar conflitos e proteger de possíveis invasões de não indígenas, contudo, ainda se mantém viva a luta dos povos indígenas quanto à garantia efetiva desse direito.  

O Brasil teve cinco anos sem nenhuma demarcação, e no primeiro ano do atual governo, chega com o total de 511 TIs com processos de demarcação finalizados, ainda assim, faltam 255 Terras Indígenas com processos de demarcação iniciados, mas não finalizados.

A região Oeste do Pará teve uma recente conquista quanto a demarcação de terras, a Terra Indígena Maró povoada por 400 indígenas dos Povos Arapiun e Borari tiveram seu território demarcado, pertencente à T.I Maró que corresponde a uma área de aproximadamente 42.373 hectares. O que representa algo significativo para os povos indígenas, ainda assim, a luta continua para que mais territórios sejam demarcados.

O Conselho Indígena Tapajós Arapiuns - CITA é a organização que representa os 14  povos em 121 aldeias distribuídas em 18 territórios no rio Tapajós, rio Arapiuns e no Planalto de Santarém, no rio Maró e na terra indígena Andirá Amaral, nos municípios de Santarém, Belterra e Aveiro. Em entrevista ao Tapajós de Fato Lucas Tupinambá, atualmente vice-coordenador do CITA, fala sobre a mobilização dos indígenas para a COP- 30 e sobre a realidade dos povos junto à administração pública nacional e sobre a tese do Marco Temporal.

“Isso é uma afronta direta para nós, para os indígenas, sabendo que nós já estamos aqui há muitos e muitos anos. É importante falar sobre a COP, mas também é importante se falar sobre as populações que estão principalmente na Amazônia e também aqui no estado do Pará. E nós, movimentos sociais, estamos vendo muito pouco a mobilização, sobre a COP. mas nós com os movimentos sociais já iniciamos sim conversas entre organizações, mas estamos na expectativa de claro, acrescentar ainda mais organizações a essa conversa para que sejam tomadas decisões conjuntas. No município aqui de Santarém temos diversas organizações dos movimentos sociais e é preciso montarmos uma estratégia para irmos a Belém levar nossas principais demandas, e não existe floresta em pé sem essa população aí que defende diariamente a proteção da natureza, do meio ambiente, né? Dos rios, da mata, dos lagos, dos igarapés".

Foto/ Acervo Pessoal

A COP- 30 é um espaço de debate onde todas as organizações da sociedade civil adentram no diálogo internacional sobre o Clima. A Conferência do Clima possibilita que se mostre, de fato, a real situação climática de quem está na base, sofrendo mais diretamente os danos causados pelo desequilíbrio de uma visão de progresso que emerge contrapondo os modos de vida amazônicos. Daí a compreensão de que medidas que envolvam a sociedade, de modo geral, e líderes internacionais, nacionais e locais, na construção de um novo modelo de vida que possibilite maior e melhor segurança de vida na manutenção do bem viver e da esperança em recompor a harmonia com a natureza pela sobrevivência e não a extinção da humanidade.

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