Na manhã desta terça-feira (14) lideranças indígenas de várias etnias do Baixo Tapajós e de outras regiões do Pará ocuparam a sede da Secretaria Estadual de Educação - SEDUC, em Belém. O protesto tenta impedir a extinção do Sistema Modular de Ensino Indígena (Somei), que compõe o Sistema Modular de Ensino (Some).
Os manifestantes reforçam que a ocupação se deu devido a falta de diálogo do governo com os indígenas. “Em mais um ato em que não somos atendidos pelos funcionários da SEDUC, tivemos que usar a força dos encantados para podermos entrar em um espaço que também é nosso”, enfatizaram os manifestantes.
Alessandra Korap, liderança indígena, por meio de suas redes sociais, enfatizou a precariedade da educação indígena no estado. “Ocupamos a Seduc no Estado Pará, o governador da COP 30 é traidor da Educação, tirou SOME e SOMEI e gratificação dos professores. A escola e os alunos do ensino médio são abandonados pelo governador do Estado, [...]mexeu com a Educação indígena mexeram com os formigueiros, extinguiram a educação indígena”, explicou Alessandra Korap, em suas redes sociais.
A manifestação segue de forma pacífica por parte dos indígenas, mas governo desligou água e energia do prédio e impede a entrada de alimentos (Foto Fabyo Cruz/CENARIUM)
Após boatos, falsos, de que os manifestantes teriam promovido quebra-quebra e bagunça durante a ocupação do prédio, o movimento indígena divulgou vídeos em suas redes sociais que mostram que não houve bagunça nem quebra de equipamentos. A manifestação tem seguido de forma pacífica por parte dos manifestantes que seguem ocupando a sala da SEDUC.
Professores da rede estadual de ensino, que foram reprimidos com violência pela Polícia Militar durante uma manifestação em frente à Assembleia Legislativa do Pará (Alepa) no dia 18 de dezembro, também participam desse momento de manifestação, dando apoio ao movimento indígena. Eles enfatizam que o protesto de hoje, também é contra cortes e mudanças que impactam diretamente nas condições de trabalho.
Para os participantes do ato, as ações do governo, lideradas por Helder Barbalho (MDB), representam um ataque direto à valorização do ensino público.
Os indígenas reivindicam contra a extinção do SOMEI e o desmonte da educação indígena no Pará (Foto Associação Pariri)
Cárcere privado
Em repressão a manifestação dos indígenas, o governo desligou a água e a energia do prédio, que segue sendo monitorado pela força policial armada. Os manifestantes também denunciam que a polícia jogou spray de pimenta nos banheiros a fim de inviabilizar a utilização dos mesmos pelos manifestantes, que seguem em cárcere privado.
Novos manifestantes estão sendo impedidos de adentrar o prédio e está sendo impossibilitado, pela polícia, o acesso a alimentação para quem está dentro do prédio.
“Nós estamos aqui com lideranças indígenas de toda a região do estado do Pará [...] chegamos aqui cedo, estamos com crianças, idosos e professores. Várias outras lideranças estão sendo impedidas de entrar. O governo mandou pra cá a polícia na tentativa de nos intimidar [...] Mais cedo um policial foi negociar conosco e negociamos que os parentes que chegassem iam entrar e que a nossa alimentação também ia entrar no prédio, agora a polícia não deixa entrar a alimentação [...] O que vocês estão vendo aqui é um ato de movimento indígena que não concorda com as ações do governo”, reforçou Auricélia Arapiun, liderança indígena do Baixo Tapajós.
Os manifestantes seguem firmes e cobram a presença do governo, na pessoa da Vice-governadora Hana Ghassan, na sede da SEDUC. Eles reforçam que não há porque formar comissão para reunir, a comissão são as lideranças que seguem ocupando o prédio de forma pacífica e convocam o governo para se fazer presente e dialogar com eles lá.
Posicionamento do governo
O governo de Helder Barbalho (MDB), por meio da Secretaria Estadual de Educação, em nota, informou que é contra todo ato de violência, e que é inverídica a informação de que o SOME será finalizado.
“[...] sem solicitação prévia de audiência com a pasta, arrombaram o portão da Seduc às 7h37, antes do início do expediente. Os participantes alegam o fim do atendimento do Sistema de Organização Modular de Ensino (Some). A Seduc ressalta que é contra todo ato de violência e informa que não é verdade que o Sistema de Organização Modular de Ensino (Some) será finalizado. As áreas continuarão a ser atendidas pelo programa, que chega a pagar até R$ 27 mil para que professores atuem em localidades remotas. Em média, o professor do Some recebe R$ 23,9 mil”, informa um trecho da nota.
No entanto, é de conhecimento de todos a exclusão do capítulo II da legislação do SOME, que trata do Sistema Modular de Educação Indígena, fato esse que levou os indígenas a se manifestarem.
Apoio da Sociedade Civil Organizada
Várias organizações da sociedade civil organizada e representantes políticos se manifestaram em apoio ao ato organizado e realizado pelo movimento indígena. A deputada Estadual Lívia Duarte (PSOL), juntamente com a vereadora Vivi Reis (PSOL) estiveram na sede da SEDUC corroborando a manifestação.
Também em nota, a Cúpula dos Povos, manifestou repúdio à posição do governo em relação aos indígenas que ocupam a sede da SEDUC, e demonstrou solidariedade aos povos Munduruku, Tembé, Xikrim, Borari, Arapiun e outras etnias que seguem na mobilização.
“A Cúpula dos Povos repudia com veemência a violência e o autoritarismo do Governo do Pará, que mais uma vez desrespeita os direitos dos povos indígenas. Exigimos o fim das hostilidades, o diálogo urgente e o respeito aos direitos das comunidades afetadas. Não podemos aceitar mais autoritarismo, violência e desrespeito à educação indígena”, trecho da nota.
A alguns meses da COP 30, a Cúpula dos Povos se ressente da forma como nossos guardiões das florestas, rios e ar são tratados em Belém, por parte do governo que segundo a nota “opta por um tipo de gestão que alimenta o conflito”.