Quarta, 19 de Março de 2025
Amazônia Preservação

Comunidade de Coroca realiza 2ª soltura de filhotes de tartarugas da Amazônia no Rio Arapiuns, em Santarém (PA)

Comunitários da comunidade de Coroca seguem firmes na preservação das tartarugas-da-Amazônia, enfrentando desafios impostos pelas mudanças climáticas e pela negligência do poder público.

15/02/2025 às 13h22 Atualizada em 15/02/2025 às 13h45
Por: Marta Silva Fonte: Tapajós de Fato
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Registro da 1ª soltura/ Foto APRUCIPESC (arquivo pessoal)
Registro da 1ª soltura/ Foto APRUCIPESC (arquivo pessoal)

No dia 15 de fevereiro, a comunidade de Coroca, localizada no Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Lago Grande, em Santarém, realizou a segunda soltura de filhotes de tartarugas-da-Amazônia. Organizado pela Associação dos Produtores Rurais e Criadores de Peixes da Comunidade de Coroca (APRUCIPESC) e pelo Complexo de Turismo de Base Comunitária, o evento devolveu à natureza cerca de 2.000 filhotes, reforçando a importância da preservação ambiental e o esforço contínuo da comunidade em manter o equilíbrio ecológico do Rio Arapiuns.

Soltura de tartarugas de 2025 na comunidade Coroca / Foto: Tapajós de Fato

Em entrevista ao Tapajós de Fato Luziete da Silva Corrêa, vice-presidente da APRUCIPESC e uma das coordenadoras do projeto, reforça a satisfação desse momento. “Para nós é muito, muito, muito gratificante esse nosso trabalho que a gente faz, esse projeto sustentável de preservar as nossas tartarugas, para que as nossas futuras gerações ainda possam conhecer, ver, vivenciar e levar esse projeto em frente”, destaca.

No dia 15, a programação começou às 8h com um café da manhã comunitário, seguido por uma cerimônia com representantes de entidades ambientais e lideranças locais. A soltura foi dividida em etapas, com participação do público e de crianças da comunidade. O evento se encerrou com um almoço coletivo e visitas guiadas aos berçários das tartarugas, para quem desejar viver essa experiência.

Crianças participando da soltura de tartarugas / Foto: Tapajós de Fato

O evento além de fortalecer o turismo de base comunitária, também conscientiza sobre a preservação da natureza, como pontua Andrea Duarte, que participou pela primeira vez da soltura, e levou seus dois filhos para essa experiência. "Foi uma experiência incrível, porque a essência da própria preservação e conhecer um pouco da comunidade, das vivências, da história foi também muito bom. Fi uma experiência única que eu fiquei emocionada, e eu queria muito proporcionar isso hoje aos meus filhos, desde a primeira soltura que eu acompanhei pelas redes sociais {...} então registrar e fazer com que meus filhos presenciassem esse momento foi assim algo não tenho nem palavras para descrever, mas foi algo muito emocionante, foi muito bom porque eu acho que vai ficar como uma memória afetiva e uma memória também consciente para eles, porque eles gostam muito de animais e dessa questão ambiental, e é isso que a soltura traz né, essa preservação não só do próprio meio ambiente, mas da própria história da comunidade e da Amazônia".

Soltura de tartarugas na comunidade Coroca / Foto: Tapajós de Fato

O projeto e sua relevância

A iniciativa de preservação dos quelônios realizada pelos comunitários teve início nos anos 90, por incentivo do padre verbita José Gróes. Em 1998, o IBAMA doou três mil filhotes de tartarugas para a comunidade, que desde então mantém o projeto de repovoamento da espécie. 

“As tartarugas chegaram para a gente ainda filhotes, com apenas dois meses. Foram 26 anos de dedicação para chegarmos até aqui, e esse trabalho precisa continuar para que as futuras gerações possam conhecer e preservar essa espécie tão importante para o ecossistema”, destaca Luziete.

Atualmente, o turismo de base comunitária é a principal fonte de renda para os moradores, garantindo a sustentabilidade da iniciativa e movimentando a economia local por meio da comercialização de artesanato, produtos regionais e passeios ecológicos.

A visita ao lago é uma atração fascinante/ Foto APRUCIPESC (arquivo pessoal)

“Hoje, o nosso projeto é a nossa principal fonte de renda [...] ele traz visitantes de todos os estados brasileiros e também de alguns países [...] E o nosso projeto é um projeto totalmente sustentável, não só com a criação de tartarugas, como na preservação também das abelhas nativas sem ferrão, trabalhamos principalmente com a jandaíra e a canudo, também na comercialização dos produtos das abelhas, como o mel, o pólen, a própolis, a pimenta com mel e etc. Então, este projeto traz benefícios não só para a comunidade de Coroca, como também para as comunidades ao redor, na associação de artesanato [...] né, mais sete comunidades fazem parte da nossa atividade aqui na produção do artesanato”, explica.

Desafios e a falta de apoio governamental

Foto APRUCIPESC (arquivo pessoal)

Apesar do sucesso do projeto, os desafios são constantes, especialmente devido à falta de apoio governamental, principalmente em nível municipal. Luziette enfatiza que, mesmo diante das dificuldades, a comunidade tem se mobilizado para manter a soltura dos quelônios. A maior parte dos recursos mobilizados para o evento vem do esforço dos próprios comunitários e de algumas ONGs, como a Sapopema, que contribuem com doações de alimentos para o evento.

As dificuldades não param por aí. As mudanças climáticas têm afetado diretamente a reprodução das tartarugas. Segundo Luziette, a seca extrema e o calor intenso de 2024 impactaram severamente os ninhos. “Tivemos ninhos que perderam até 50% dos filhotes. A temperatura elevada prejudicou a incubação e a qualidade da água também foi afetada. A gente percebeu que os lagos estavam mais secos e com coloração diferente, o que prejudicou ainda mais o desenvolvimento dos filhotes”, relata.

Luziete  enfatiza que na ocasião foi solicitado ajuda para a gestão municipal, mas a mesma não resultou em nada. “Pedimos ajuda para a Secretaria de Turismo e outras entidades, mas não tivemos resposta”.

Mesmo diante de tantos desafios, a comunidade persiste, muitas vezes utilizando os poucos recursos da própria associação para manter o projeto ativo. “A gente faz o que pode, guarda um pouco no caixa da associação e usa para cobrir as despesas do evento, o restante é suprido por ajuda das comunidades e por algumas ONGs”, desabafa Luziette.

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