Quarta, 19 de Março de 2025
Cultura Articulação

Alter do Chão, em Santarém (PA), sediou encontro entre organizações, artistas e artivistas para debater cultura e clima no Brasil

A ideia do projeto surgiu lá atrás, em um encontro entre Amazônia de Pé e People’s Palace Projects, quando a partir de uma inquietação surgiu as perguntas norteadoras: O que a cultura tem a ver com clima? E de que maneira interligar esses dois pontos e comunicar às pessoas sobre a conexão entre eles?

19/02/2025 às 13h08 Atualizada em 19/02/2025 às 14h45
Por: Conce Gomes Fonte: Tapajós de Fato
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O “Encontro Vozes da Cultura pelo Clima, trilhando caminhos para a COP 30", aconteceu entre os dias 11, 12 e 13 de fevereiro, em Alter do Chão, e faz parte do projeto “Clima é Cultura: Trilhando caminhos para a COP30. A proposta traz a cultura como peça chave para a transformação ante ao debate climático.

O evento foi organizado pela Amazônia de Pé (AdP) e a People 's Palace Projects (PPP), que atuam promovendo mobilização, editais, pesquisas e seminários para fortalecer essa frente nacional e internacional.

A People’s Palace Projects é um centro de arte e pesquisa que reúne artistas, ativistas, acadêmicos e públicos para desafiar as injustiças sociais e climáticas com poder das artes, no Reino Unido, Brasil e além. E a Amazônia de Pé (AdP), é um movimento pela proteção das florestas e dos povos da Amazônia, presente em redes, ruas e rios das cinco regiões do Brasil.

Nesse espaço de debate, foram convidados 30 artistas, mestres e mestras da cultura popular, fazedores de cultura, ativistas socioambientais e climáticos, pesquisadores, ambientalistas e comunicadores, em sua maioria, da região amazônica.

Foram três dias de encontro divididos em três etapas:

Dia 1: Chegar e aterrar - Neste primeiro momento, os participantes chegaram e se apresentaram, e mapearam ações e atores, e partilharam falas inspiradoras sobre a COP 30, com um dinâmico momento de interação entre os participantes.

Dia 2: Imaginar e construir- O segundo dia foi um espaço para conhecer o território juntamente com as Suraras do Tapajós, e foi também o momento em que se imaginou e construiu propostas e ideias sobre a elaboração da cartilha.

Dia 3: Trilhar e flechar- O terceiro e último dia de encontro foi importante para trilhar estratégias e ideias sobre a carta de recomendação e de que maneira é possível realizar a incidência na COP 30 colocando em pauta a Cultura e fazendo com que essa reivindicação chegue nas mesas de negociação da COP 30. O encerramento se deu com um coquetel e o palco aberto onde os artistas puderam expor sua arte, que neste momento tem sido utilizada como ferramenta de luta nos territórios brasileiros.

Esses foram os três passos essenciais para trilhar os caminhos e traçar plano estratégico para incidir na COP30 que acontecerá na capital paraense, Belém, em novembro de 2025.

O Encontro Vozes da Cultura pelo Clima foi sediado pela Associação de Mulheres Indígenas Suraras do Tapajós, tendo Alter do Chão, o território Borari  como um lugar de confluência, sabedoria ancestral, resistência cultural, respeito pela terra e luta pelo território.

Foto/ Ascom Cultura é Clima

Para além do trabalho burocrático, o evento foi um espaço para pensar, sonhar  e construir usando a arte e trilhando esse caminho reforçando a validação do primeiro encontro. Com o objetivo de que haja mais a presença da cultura nos debates institucionais da administração pública, que os planos de cultura tenham planos de comunicação popular e que isso seja inserido nas ações climáticas.

Em entrevista ao Tapajós de Fato, Leila Borari, coordenadora de articulação cultural do Amazônia de Pé compartilha sobre o primeiro Encontro Vozes da Cultura pelo Clima, e a importância do evento acontecer aqui, na Amazônia, no Baixo Tapajós, dando ênfase à cultura como chave principal para combater as mudanças climáticas. “Quando a gente fala que a nossa cultura é dos  povos da floresta, nós somos os povos que mais combatem as questões climáticas porque a gente protege o território, protege a Amazônia, mas nós também somos os que mais sofrem com as mudanças climáticas. E a nossa cultura é afetada diretamente”.

Foto/ Apoena Produtora- AdP

Levando em consideração mudanças perceptíveis no cotidiano, Leila ressalta: “Então quando a gente pega uma chuva que é fora de época, quando a grande seca também, ela vem e nos assola e deixa a gente isolado, e deixa a gente sem peixe, sem água e também afeta toda a floração de plantação das árvores e tudo, e isso afeta a nossa vida e a nossa vida é cultura…Quando a gente fala que o cardume do peixe que a gente está esperando não vai passar no período certo, é a nossa vida sendo afetada diretamente… A gente vive o nosso dia a dia, o nosso bem viver é cultura. Desde quando a gente nasce, a nossa ligação totalmente com a floresta é cultura, então a gente entende que a cultura e o clima estão interligados”.

Os parceiros do Amazônia de Pé que já atuam com Cultura e Clima se unem nessa construção para trilhar esses caminhos até a COP 30 e a ideia se junta ao propósito de formar essa grande rede de fazedores de cultura, pessoas e organizações que trabalham também com cultura.

Assim, a Amazônia de Pé e a PPP que é uma organização internacional, estão dentro de uma universidade na Inglaterra que trabalha há um tempo essa intersecção de Cultura e Clima. E dentre as discussões se debate sobre o que acontece na Amazônia não fica na Amazônia, mas, reverbera para o mundo. "E quando a gente fala em levar a nossa voz além dos territórios é isso, né? É a gente amazonizar o mundo”. E estreitar esses laços unindo pessoas com o mesmo propósito se faz necessário diante da Crise Climática mundial. 

Rilcélia Akay Munduruku, da aldeia Sawre Muybu, do Médio Tapajós, também participou do encontro, e isso mostra a atuação direta dos povos do território amazônico inseridos na construção dessa ação para a COP 30. “Para a COP30, então foi criada várias expectativas aqui nesse encontro, principalmente uma cartilha que em breve vai ser feita para estar distribuindo tanto na COP como nos territórios e também em todo lugar levando nossa voz, dos povos tradicionais em defesa dos territórios e contra os impactos da crise climática”.

Como foi criado o projeto

A ideia do projeto surgiu lá atrás, em um encontro entre Amazônia de Pé e People’s Palace Projects, quando a partir de uma inquietação surgiu as perguntas norteadoras: O que a cultura tem a ver com clima? E de que maneira interligar esses dois pontos e comunicar às pessoas sobre a conexão entre eles?

Foi a partir dessas questões que o projeto foi construído a fim de trazer essas reflexões no encontro sobre cultura e clima, e o mais importante dessa construção foi realizar essa tarefa com quem está aqui, na Amazônia. Yula Rocha, gerente de comunicação em projetos climáticos e indígenas da PPP, partilha sobre o objetivo do encontro e o desafio enfrentado. “Então, no momento inicial, a gente pensou, vamos produzir uma cartilha em que a gente possa distribuir até a COP30, que a ideia é que seja distribuída também para pessoas de outros países para que elas possam compreender esse tema. Então, eu acho que o maior desafio é fazer com que as pessoas que não estão próximas, ainda não se conectaram ao seu entorno, fazerem entender que elas fazem parte de uma coisa só, através de uma mudança cultural. Porque a gente precisa mudar a nossa cultura”.

Foto/ Apoena Produtora- AdP

O “I Encontro Vozes da Cultura Pelo Clima, trilhando ações para a CoP 30” estruturou então seu objetivo, que é debater a relação entre cultura e clima e criar, de forma coletiva, uma carta direcionada a tomadores de decisão, e a partir desse objetivo, incidir na COP30 de maneira concreta. Marcado pela construção coletiva baseado no respeito, na escuta ativa e na troca de saberes, na tentativa de inserir a cultura nas pautas e nas mesas de debate, compreendendo a cultura como parte crucial na transformação social e nos caminhos de mitigação acerca da Crise Climática mundial, entendendo e respeitando a cultura dos povos amazônicos, tanto no âmbito artístico, mas compreendendo a amplitude da palavra cultura agregando todas as vertentes que envolvem a vida cotidiana de todos os povos da Amazônia desde o plantar até o dançar como herança cultural a ser mantida e preservada.

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