Rios grandes e floresta suntuosa. Essa é a imagem que provavelmente tu vais encontrar pesquisando “Amazônia” no buscador de internet mais próximo. Atravessada por processo de colonização e modernização, a região que ciclicamente é vista como um espaço a ser descoberto e conquistado, poucas vezes tem as pessoas que a plantaram, defendem e habitam, consideradas nesse cenário. Reforçando um persistente estereótipo da região.
A essa altura já deves ter visto por aí, que Belém, uma das maiores cidades da Amazônia, irá sediar a 30ª Conferência de Clima da ONU, em novembro. A escolha do local tem a ver com um rodízio pelas regiões do mundo que a UNFCCC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas) promove. Para realizar o encontro de 2025, os países da América Latina e Caribe apoiaram a candidatura brasileira, tornando esta a quarta conferência sob liderança de um país latino.
Isso tudo para lembrar que, ainda que a COP30 aconteça na região amazônica e no Brasil, ela também estará representando a América Latina e Caribe. Mas, dentro das negociações e acordos feitos neste espaço, a discussão é sobre problemas globais relacionados à emergência climática, e como os países vão, de maneira prática, impedir que ultrapassemos o aumento de 1,5ºC da temperatura global. Ou pelo menos deveria ser.
Por que, então, se insiste em atrelar uma COP que irá acontecer na Amazônia como a COP da Floresta?
É comum as conferências ganharem adjetivos e slogans para acompanhá-las. Na COP29, do Azerbaijão, por exemplo, o slogan era Em solidariedade por um mundo verde. Popularmente, ela estava sendo conhecida como a COP do financiamento, pois a grande expectativa era que se definisse um valor para os países desenvolvidos -nomenclatura utilizada na UNFCCC- financiarem a transição energética dos demais. Como saldo da conferência, além de não termos passado perto dos US$ 1,3 trilhão ao ano pretendido, ainda tivemos que ouvir, do presidente do Azerbaijão, que petróleo e gás são um presente de Deus, e não deveríamos culpar os países por quererem oferecer isso ao mercado[1]. O que, assustadoramente, não é muito distante do que temos ouvido de nossos governantes no Brasil.
Quando a conferência se prepara para aterrissar em Belém, os componentes, do que o professor Otacílio Amaral Filho chama de marca Amazônia, são acionados. Elementos verdes e que remetem à fauna e flora, uma visão idealizada da região, reforçando a imagem de preservação da floresta como um lugar puro e intocado. A promessa, que transforma nossos bens naturais em commodities e aumenta a pressão do desmatamento, leva um selo verde de sustentabilidade. O ônus do preço alto de alimentos, que são a base da cultura alimentar amazônica, e o agravamento das desigualdades, é todo nosso. Sem falar dos problemas urbanos que são camuflados nessa narrativa, ainda que cerca de 70% da população da Amazônia Legal viva em cidades[2]. A precariedade no acesso à água e saneamento, mesmo pertencendo a uma das maiores bacias hidrográficas do mundo, é latente e pode nos deixar ainda mais fragilizados com a crescente das mudanças climáticas, por exemplo.
E é por isso que precisamos que a COP30 seja uma COP das Pessoas, onde a relação delas com os territórios seja colocada no centro do debate. Apenas zerar as emissões líquidas de gases do efeito estufa (GEE) até 2050, como está previsto na estratégia de mitigação brasileira[3], ou colocar as frotas de automóveis elétricos na rua, pauta discutida globalmente, não é suficiente para nos proteger dos efeitos da crise climática.
As Conferências de Clima são um processo, não uma linha de chegada. Mas há grandes expectativas para a COP no Brasil, tanto por acontecer em um país não ditatorial, que vai nos permitir fazer grandes mobilizações, quanto pelo papel diplomático que se tem acumulado historicamente. O Comitê COP30, uma coalizão da sociedade civil brasileira, liderada por organizações amazônidas, acredita que o país tem condições de pautar globalmente uma transição justa em que os diversos setores da sociedade possam ser incluídos. Para nós, uma COP das Pessoas significa garantir que a população esteja incluída e com seus direitos de participação, autodeterminação e manifestação garantidos, da sala de negociação às ruas e rios da cidade.
[1] https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2024/11/12/petroleo-e-gas-sao-presente-de-deus-afirma-presidente-do-azerbaijao-na-cop29.htm
[2] https://www.brasildefato.com.br/colunista/reforma-urbana-e-direito-a-cidade-nas-metropoles/2022/06/10/aspectos-do-urbano-na-amazonia/
[3] https://www.gov.br/mma/pt-br/assuntos/mudanca-do-clima/mitigacao
*As opiniões aqui expressas são da autora ou do autor e não necessariamente refletem as do Tapajós de Fato. Nosso objetivo é estimular a participação da população a enxergar a comunicação como ferramenta de luta.