Ante ao ato inconstitucional do Marco Temporal, indígenas Munduruku do Alto e Médio Tapajós, após fecharem a BR 230 por 14 dias, seguiram para Brasília com o objetivo de reunir com o ministro Supremo Tribunal Federal- STF, Gilmar Mendes, a fim de obter uma resposta sobre a tese do Marco Temporal.
Foram quatorze (14) dias intensos entre fim do mês de março e início de abril, quando em meio a resistência de vida, os indígenas ocuparam e bloquearam o entroncamento entre as BRs 163 e 230, em Itaituba, Pará, ponto estratégico para escoamento da produção do agronegócio, a fim de chamar a atenção para sua luta contra o Marco Temporal. Os dias foram corridos, e entre sol e chuva o povo continuou acampado. Lideranças, idosos, caciques, homens, mulheres e crianças se mantiveram firmes na luta, mesmo com os ataques sofridos.
Muitas violências foram cometidas contra o povo indígena que ali se encontrava. Atingidos por pedras, tentativas de atropelamento por parte dos caminhoneiros que ali passavam enraivecidos com o ato, entre outros atos, permaneciam firmes com o objetivo de alertar a população e o Governo sobre a urgência de diálogo.
O que motivou essa trajetória de mobilização e resistência, foi a tese do Marco Temporal, que há alguns anos tem sido pauta de debate no senado. A tese institui que a seja considerada a existência dos diversos povos indígenas nos territórios somente a partir da constituição de 1988, o que se enquadra no quesito inconstitucional, pois, a história, registros e pesquisas confirmam os povos indígenas como povos originários, portanto, habitantes deste território há centenas de milhares de anos, muitos anos antes da chegada da invasão portuguesa em terras brasileiras.
O bloqueio da BR 230 e a luta do povo Munduruku vai além da tese do Marco temporal, como diz Alessandra Korap Munduruku, liderança indígena, “aqui a luta do povo Munduruku não é uma luta só por conta de uma lei, por conta do Marco Temporal, é por todas as violações que estão acontecendo com os povos indígenas, com o planeta e com a nossa mãe natureza”.
Dentre as reivindicações durante a ocupação da BR 230 estavam a pretensão de uma audiência com o ministro do STF Gilmar Mendes, o fim da mesa de conciliação conduzida pelo ministro e a revogação da Lei 14.701/2023, tema da conciliação e tese sobre o Marco Temporal. E no décimo dia de ocupação, o povo Munduruku divulgou uma carta, onde um trecho dizia “Não sairemos sem sermos ouvidos”.
Após 14 dias lutando e resistindo durante o bloqueio da BR 230, o povo Munduruku obteve uma resposta positiva. Uma audiência foi marcada entre o povo Munduruku e o ministro do STF, Gilmar Mendes.
E a partir de então, a luta se direcionou na busca de apoio para que o povo Munduruku, em números de aproximadamente 120 pessoas entre mulheres, mulheres grávidas, crianças, idosos e lideranças chegassem em Brasília, onde acontece a reunião com o ministro Gilmar Mendes. Essa possibilidade reafirma a importância e urgência em dialogar diretamente com as autoridades sobre a preservação de seus territórios e o reconhecimento, mas também garantia de seus direitos.
A audiência está prevista para o dia 15 de abril de 2025. No mesmo período, entre os dias 7 e 11 de abril, aconteceu o Acampamento Terra Livre- ATL, maior encontro de mobilização indígena nacional.
Após a liberação da rodovia, bloqueada pelos indígenas Munduruku por 14 dias, a delegação Munduruku seguiu viagem até Brasília para acompanhar o final do ATL e também aguardar o dia em que haverá a audiência com o ministro. Segundo a liderança Alessandra Korap “estamos indo com toda essa delegação indo para Brasília acompanhar o final do ATL, mas também uma audiência com Gilmar Mendes que vai acontecer dia 15. Estamos muito felizes porque o objetivo da manifestação contra o Marco Temporal aqui na BR 230 valeu a pena com todo suor, todo sofrimento, com garra, com força que esses guerreiros e guerreiras, caciques, cacicas, mulheres grávidas e crianças resistiram 14 dias na BR 230, Sawê!”.
No dia nove (9) de abril a delegação chegou em Brasília às 5h30min, foram três dias de viagem de ônibus, para acompanhar o ATL e as discussões, e para a agenda com o Gilmar Mendes, pois como reforça Alessandra Korap Munduruku “É muito importante os povos indígenas estarem juntos, principalmente quem está nos ,mas também quem está na cidade, que está na universidade, que estão em todos os lugares do Brasil. Muitos deles estudam, muitos deles estão na roça, muitos deles estão pescando, mas a luta é muito grande para aqueles que não tem nenhuma informação. Estamos aqui com sorriso no rosto, sempre eu digo, o que move nossa luta, o que move o mundo é nosso sorriso, é a nossa alegria, porque é isso que faz o inimigo estremecer. E é o sorriso que os inimigos acabam se rendendo porque nós povos indígenas não se rende por nenhuma migalha, pode oferecer o que for, o mais importante para nós é o território. Sawê!”.
Durante o ATL, Alessandra falou sobre as empresas que chegam e destroem os territórios, na presença de lideranças como Marina Silva discursou que “Não é pariwat (branco), não é empresa, não é ninguém que vai tentar entrar ou tentar nos tirar. Porque nós somos aqui mulheres, guerreiras, crianças que vão pra luta sim. Pra sair do nosso território e dizer, ‘aqui vocês não mandam, quem manda somos nós’ Nós que mandamos no nosso território”.
A líder Munduruku enfatizou em sua fala que a COP 30 está chegando, e questiona: “Que COP é essa que não tem povos indígenas que vão decidir? Que COP é essa que não podemos falar dos nossos territórios, dos nossos rios e das nossas florestas?”. Destaca ainda: “Será que essa COP só serve pras grandes empresas multinacional e pra líderes mundiais? Não! Ela não serve pra isso. Serve pra nós”.
Alessandra questionou também o governo Lula, na presença de Marina Silva, e expôs sua oposição quanto à exploração de petróleo na Amazônia e ao STF por não cumprir a Constituição não demarcando as terras indígenas.
Na manhã de domingo (13), lideranças Munduruku, Kaiapó e Yanomami reuniram para tratar sobre os direcionamentos até a audiência com o ministro Gilmar Mendes.