Amabela: mulheres agricultoras familiares celebram dez anos de força e transformação no campo em Belterra, no Pará

Um caminho de luta, resistência e conquistas da união de mulheres agricultoras do Oeste do Pará.

20/05/2025 às 15h04
Por: Conce Gomes Fonte: Tapajós de Fato
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Foto: José Marcos
Foto: José Marcos

A Amabela é uma Associação Intermunicipal de Mulheres Produtoras Rurais, que surgiu em 2014 durante uma reunião no Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais- STTR, em Santarém, e atua nos municípios de Mojuí dos Campos, Belterra e Placas.

O surgimento e criação da Associação Amabela, bem como as demais associações somente de mulheres produtoras rurais, se deu pela necessidade de espaços de fala, onde suas vozes fossem ouvidas e valorizadas, pois naquele momento, as mulheres não se sentiam contempladas, e necessitavam que suas ideias saíssem do papel.

Foto: Arquivo Pessoal

A partir de então, com o apoio de Sara Pereira da Fase e do Fundo Dema, deu- se início à mobilização das mulheres. Liderado por dona Selma Ferreira e outras mulheres, o movimento de mobilização aconteceu com o chamado a várias mulheres que estivessem dispostas a participar da nova associação. Com apoio de um fundo chamado “Irmã Dorothy do Espírito Santo”, formou- se o grupo base para essa mobilização de chamamento e também a construção da ata e estatuto de criação da Associação Amabela.

Logomarca Amabela

Assim, em 16 de maio de 2015, nasceu a Associação de Mulheres Produtoras Rurais Amabela, no barracão do Sindicato de Belterra, onde era realizada a Assembleia que dava início à história das mulheres.

Com 85 participantes, a escolha da primeira diretoria e da sigla da Associação, começa uma caminhada de luta, união e força das mulheres trabalhadoras rurais. Inicia- se uma caminhada de muitos desafios, mas também de conquistas.

Desde sua fundação em 2015, a Amabela tem sido um pilar fundamental na promoção da autonomia econômica, social e política de suas associadas. Sua base fundamental é o trabalho coletivo, empoderamento feminino, empoderamento político e econômico e fortalecimento da agroecologia, assim, a associação desempenha um papel essencial no desenvolvimento sustentável da região.

Conquistas e iniciativas

Ao longo dos anos, a AMABELA tem apoiado suas associadas por meio de diversas ações, como os puxiruns (mutirões) realizados nas propriedades, atendendo às necessidades urgentes das famílias. Entre as atividades desenvolvidas estão o cultivo de hortas, a limpeza de Sistemas Agroflorestais (SAFs) e a produção de mudas. Além disso, a associação promove cursos sobre aproveitamento de frutas, produção de doces e licores, corte e costura, e elaboração de adubos orgânicos, defensivos e fertilizantes naturais, entre outras atividades.

Projetos de grande impacto também marcaram essa trajetória. Entre 2017 e 2018, a associação desenvolveu um projeto de criação de galinhas, financiado pelo Fundo Dorothy Maria do Espírito Santo, beneficiando 10 mulheres associadas. Em 2018, obteve a doação de uma Kombi para apoiar a comercialização dos produtos das associadas. Em 2023, firmou parceria com a organização CI Brasil para um projeto de bioeconomia, resultando na doação de equipamentos e utensílios para os mutirões. Entre 2023 e 2024, executou um projeto financiado pelo Fundo Dema, voltado à produção de hortaliças e criação de pequenos animais.

Desde sua criação, a AMABELA prioriza o fortalecimento da produção familiar, essencial para a geração de renda e o empoderamento das mulheres. Para isso, tem estabelecido parcerias estratégicas com instituições como a Universidade Federal do Oeste do Pará (via Incubadora de Empreendimentos Solidários), a Emater-Escritório de Belterra, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Belterra, o Instituto Conexões Sustentáveis (CONEXSUS), a Conservação Internacional (CI Brasil) e o Projeto Mulheres Empreendedoras da Floresta, vinculado ao Projeto Saúde e Alegria e ao STTR de Santarém.

Os dez anos da Amabela

No dia 17 de maio de 2025, a Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais do município de Belterra (Amabela), celebra uma década de existência, resistência e conquistas. A Amabela tornou- se referência na organização das mulheres do campo, promovendo a autonomia financeira, econômica, política e cidadã de suas associadas.

Em dez anos de atuação, pode- se considerar que as mulheres da Amabela já conquistaram inúmeros feitos, e tudo caminha para que as coisas fiquem melhores, segundo dona Selma Ferreira, atual coordenadora, e umas das fundadoras, que esteve presente desde o início dessa história.

Foto: Selia Nerys / Selma Ferreira em sua plantação

“O trabalho com a Amabela tá sendo bastante produtivo. Estamos alcançando nossas demandas, com projetos, com eventos, e com bastante produtividade dentro da área da agroecologia. Pra mim tá sendo muito bom trabalhar como coordenadora da Amabela”.

Selma Ferreira enfatiza ainda: “Alcançamos nossos dez anos da Amabela com muita resistência, muito fortalecimento, né? Com várias mulheres empoderadas que trabalham dentro da linhagem da agricultura familiar, cuidando do seu próprio alimento, e mulheres que vão pra feira, mulheres que tão prontas pra enfrentar esse mundo de comunicação. Tem várias categorias já, dentro da Amabela que foi desenvolvido durante os dez anos com bastante capacitação, oficinas, projetos, é, graças a Deus nós tivemos muitas regalias e por esse motivo só tenho que agradecer a Deus e aos parceiros que acreditam na Amabela.” 

Nesses anos de caminhada, uma das conquistas da Amabela foi um transporte (kombi) que contribui para o escoamento da produção das mulheres agricultoras, tendo em vista que o escoamento da produção da agricultura familiar é por vezes desafiador.

Foto: arquivo pessoal

Em meio a desafios e conquistas, mulheres da Amabela festejam e comemoram cada passo no decorrer de uma década de muita organização e fortalecimento econômico, social e político de suas associadas. Muitas vidas transformadas a partir do trabalho coletivo, do empoderamento feminino e da agroecologia. 

Card divulgação- 10 anos da Amabela

A programação em celebração aos dez anos da Associação de Mulheres Agricultoras Rurais- Amabela aconteceu na cidade de Belterra, a partir das nove horas da manhã e seu início foi marcado pelo mergulho na história da associação, onde as mulheres relembraram  a trajetória, lutas e avanços, reunindo mulheres de várias comunidades e convidadas especiais.

Outro momento de celebração foi a programação cultural especial, onde houve destaques ao talento e força feminina na região, valorizando a arte, cultura popular e o protagonismo feminino no município, com dança de carimbó da Amabela, apresentação musical de Livaldo Sarmento, declamações de poesias, apresentações das associadas e demais convidados. Além do hino oficial da Amabela denominado “Mulheres da Terra”, composto por Mônica de Almeida e Toninha Arcanjo para homenagear a Amabela por seus dez anos de existência.

Durante o evento aconteceu a Feira da Amabela com os produtos agroecológicos das associadas, todo valor arrecadado será revertido para a construção do Núcleo de Belterra da associação. A comemoração dos dez anos da Amabela foi um momento de reflexão, reconhecimento e celebração da força das mulheres rurais belterrenses.

Foto: Tapajós de Fato - Feira Agroecológica Amabela 10 anos

Um momento simbólico durante o evento foi a troca de sementes. Essa troca representa muito não só para as mulheres da Amabela, mas também para outras mulheres. Ela surgiu a partir da curiosidade das mulheres sempre em busca de “uma plantinha diferente”, e também pelas questões de sustentabilidade. Daí surgiu a ideia de realizar as trocas de sementes. Selma Ferreira comenta que “como o nosso município já é muito pobre na questão de sementes crioulas, aí a gente começou trabalhar na troca de semente crioulas e sementes da biodiversidade que era pra fazer a implementação dos nossos SAFS”.

Os SAFs são Sistemas Agroflorestais, a partir da ideia, segundo ela, “começamos a fazer feiras de exposição de sementes Sabores e Saberes da Amabela. E hoje a gente já está com dez anos fazendo essa troca e já é uma tradição de todos os anos fazer uma troca de semente, a gente deixa lá as sementes e cada um vai lá escolhe pra plantar em outros lugares, em outros municípios. É muito interessante, e é muito emocionante o momento da troca é um momento de reflexão um momento de doação do nosso próprio ser para a natureza né?”.

Foto: Tapajós de Fato

Dona Selma enfatiza ainda “o quanto a mãe terra está precisando da nossa doação para com ela, pra trabalhar, pra plantar, pra cultivar, pra reflorestar, pra trabalhar nas hortas, trabalhar no quintais produtivos, nos nossos SAFs. Então nossa mãe natureza está precisando desse carinho, desse afeto de mulher, de mulher para a mãe terra. E nesse momento nós estamos doando nossos conhecimentos e mostrando que a experiência vale a pena”.

Dona Veralícia, de 60 anos, foi a primeira presidente da Amabela por seis anos, e por três anos vice, assumindo por nove anos a frente da Associação e construindo história. Vera compartilha a importância desse aniversário de dez anos quando refere-se ao empoderamento feminino e a amizade construída entre as mulheres e ao resgate do conhecimento ancestral, dos conhecimentos que os pais já traziam, sobre os cuidados com a terra.

Foto: Tapajós de Fato - Veralícia e sua mãe 

“Hoje a gente vê as nossas mulheres, elas buscaram, né? Dentro da associação novos conhecimentos, hoje já deu de perceber na fala da mesa o quanto mudou, a associação na vida das mulheres né? Isso é motivo de gratidão, saber que a Amabela com a sua força feminina, com essa busca de novos conhecimento a gente consegue transformar a nossa vida e a vida da amiga. Isso é importante”.

Unindo a força e o poder feminino aos conhecimentos ancestrais, o resgate desse cuidado com a outra e com a terra foi o que impulsionou o crescimento da Amabela, unidas também na luta pela soberania alimentar diante de um contexto de agronegócio onde o uso excessivo de agrotóxico compromete a sua saúde, de suas famílias e entorno.

“Buscar o conhecimento do passado, que é o conhecimento dos nossos pais, dos nossos avós né? E quando surge a associação a gente resgata esse trabalho que já fazia antes, mas não tinha o conhecimento desse nome tão bonito e tão importante que é a agroecologia. Hoje a gente trabalha com nossos quintais produtivos, com reflorestamento da terra quevem sofrendo com o desmatamento do agronegócio e a gente vem buscando, lutando pra manter no meio pra ter nossa alimentação saudável, pra saber o que nós colocamos na nossa mesa. Contra o veneno, contra esse agrotóxico que está muito forte dentro do município de Belterra, município de Mojuí dos Campo, né? E o município de Santarém também, e a gente faz mesmo o nosso próprio adubo caseiro, né? E a gente mesmo produz, recebe oficina da Fase e da Emater, onde a gente produz nossos festilizantes que a gente usa nas nossas plantações sem usar o agrotóxico. Tudo é natural”, comenta Veralícia  .

A partir dessa realidade, as parcerias são fortalecidas na busca de adquirir mais conhecimentos para que todas as mulheres tenham seus quintais produtivos e sem uso de agrotóxico, trazendo alimentação saudável para suas famílias. Seus adubos caseiros são todos fabricados de maneira natural com apoio da Fase e Emater, onde onde elas mesmas produzem seus fertilizantes naturais que são usados em suas plantações.

Durante o evento de dez anos da Amabela, aconteceu também o lançamento do primeiro livro escrito por dona Maria Irlanda de Almeida, sócia fundadora da Amabela, com o título: ”A luta das mulheres trabalhadoras rurais de Belterra por justiça, terra e vida digna. Amabela, dez anos de resistência e esperança. Relato de Maria Irlanda de Almeida.”

“A Amabela hoje na sua pré adolescência, nós vamos contando a verdadeira história da Amabela, jamais vai se perder no ar e aqui fica registrado nesse livro. E o que representa pra mim escrever e lançar este livro durante a comemoração,  é para que todas nós, tanto as sócias fundadoras quanto as atuais, conheçam a verdadeira história da Amabela. E lançar o livro neste dia, neste momento tão lindo também é para contribuir com a Amabela na construção do nosso espaço físico no núcleo de Belterra”, comenta dona Irlanda.

Foto: Tapajós de Fato - Maria Irlanda segurando seu livro que conta a história da Amabela 

O futuro se desenha com novos desafios mas também com oportunidades para fortalecer ainda mais essa trajetória de transformação e impacto social. O protagonismo feminino na luta por soberania alimentar reflete a força e o poder das mulheres unidas rumo a um ideal. Vencendo barreiras e quebrando estruturas patriarcais impostas por uma história de dor, as mulheres “aram” caminhos para si deixando um legado às novas gerações. Pois como diz a frase que ressoa em diferentes movimentos e iniciativas que valorizam o empoderamento feminino: “Mulheres são como águas, crescem quando se encontram.”

Salve a força e o poder das mulheres!

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