A folia carnavalesca brasileira pode ser considerado "o ópio do povo", ou seja, um momento reservado para a população se distanciar de seus problemas e das questões sociais e ambientais que afligem o país, porém, no Bairro do Mapiri, zona norte de Santarém, a alegria deste festejo se torna ainda mais contagiante quando unida a temática ecológica da preservação dos lagos que em um certo momento da história do bairro foram fonte de sustento e subsistência, e hoje sofrem com as mazelas do desenvolvimento desenfreado.
Para explicar melhor sobre a origem do bloco e sua função social, o Tapajós de Fato ouviu Maria Das Dores Colares Joseph, membro da diretoria do bloco. Segundo Maria, o bloco surge de uma reflexão da campanha da fraternidade de 2016 que naquele ano falava sobre saneamento básico e cuidado com o planeta, e tinha como tema "Casa Comum, nossa responsabilidade".
"Nosso bloco surge de um grupo de pessoas da Comunidade Menino Jesus, que se importa com a preservação dos lagos Mapiri e Papucú, e que resolveram levar a Campanha da Fraternidade para além da igreja, e decidiram trabalhar a preservação ambiental da melhor forma, pulando carnaval" disse Maria Das Dores.
O bloco tem como símbolo o jaraqui, espécie que era facilmente encontrada no lago Mapiri, e que, como outras espécies de animais, hoje apenas são lembradas pelas marchinhas carnavalescas do bloco compostas por Claudionor Gomes, o Seu Cláudio. O TdF também ouviu Seu Cláudio para entender o processo de criação das músicas oficiais do bloco, e que além de animar os foliões também chamam atenção para a realidade do meio ambiente.
"O que nos inspira a fazer as músicas é o que não tem mais no Mapiri, o que antes tinha e hoje não se vê mais. Como a primeira música que fala sobre os peixes, que no Mapiri tínhamos facilidade de encontrar e que hoje é difícil". Em sua fala, Seu Cláudio ainda completa: "Na verdade é mais um apelo, um pedido de socorro para a natureza, que hoje o nosso lago está cheio de 'besteiras', cheio de saco plástico".
A música a que o compositor se refere é a primeira marchinha de sua autoria, feita para o carnaval de 2018, que dizia: "Cadê os peixes do Mapiri, principalmente o nosso jaraqui? Anos passados só no Mapiri que tinha nossos peixes tão gostosos pra comermos com farinha". Além do jaraqui, a música citava em seu refrão outras espécies encontradas no lago: "Jaraqui, jaraqui, só no Mapiri que tinha. Tambaqui, Tucunaré, só no Mapiri que tinha. Aracú e a Caratinga, só no Mapiri que tinha. Nossos peixes tão gostosos pra comermos com farinha".
Hoje em dia, o bloco agrega pessoas de diversos bairros da cidade e que também curtem o carnaval consciente do Bloco "SóNoMapiriQueTinha". Neste período de pandemia o bloco não saiu nas ruas como de costume, mas também não deixou de criar suas músicas e colocá-las para tocar nas rádios da cidade e também de fazer uma mobilização nas redes sociais, como no carnaval de 2021, onde foi criada uma página no Facebook para compartilhar as lembranças dos carnavais anteriores.
O bloco de rua mostra como a folia pode se unir a preservação e conscientizar a população para olharem com atenção a manutenção e ao cuidado com um dos bens mais preciosos da cidade de Santarém. O Lago do Mapiri, como já foi noticiado anteriormente no Tapajós de Fato, sofre com diversos problemas ambientais e sociais, como atração de grandes embarcações que estavam deteriorando as grades de proteção da Orla construída recentemente.