A colonização portuguesa e as missões religiosas, por séculos invadiram os territórios impondo novos modos de vida e relação com a natureza, inclusive proibindo os povos indígenas de se expressarem por meio de suas próprias línguas.
A região do Baixo Tapajós, concentra atualmente 13 povos, que vivem em cerca de 76 aldeias. O povo Borari, historicamente, ocupa a região de Alter do Chão, são eles que realizam um dos rituais mais antigos da Amazônia, o Sairé. Um momento construído por meio do puxirum, onde a comunidade toda se reúne desde a preparação até os rituais sagrados que são feitos durantes os dias de festas.
Um dos maiores desafios que os povos indígenas enfrentam no Brasil é o direito à terra e o principal inimigo dos indígenas é o próprio governo, que a todo tempo tenta criar mecanismos que possibilitem a extinção, diminuição e exploração das riquezas presentes nos territórios, como é o caso da Tese do Marco Temporal e o PL 490, que podem extinguir muitos territórios indígenas. As terras indígenas do Baixo Tapajós, que iniciaram o processo de auto pertencimento a partir da década de 90, seriam fortemente afetadas.
Território Borari
A luta do povo Borari pela titulação das terras em que vivem é longa, em 2003, os indígenas iniciaram um movimento de pertencimento à etnia Borari. No entanto, as ações oficiais do Estado voltadas para reconhecimento destes só passaram a ser direcionadas aos Borari de Alter do Chão no ano de 2004.
No ano de 2004, em alusão ao 19 de abril, data que celebra o “Dia do Índio”, os Borari de Alter do Chão realizaram uma série de atividades para mostrar que sempre estiveram ali naquele território, uma de suas ações foi a confecção de um mastro com elementos da cultura Borari, desenhado e esculpido em toda sua extensão com mais de cinco metros. O mastro foi colocado na praia do Cajueiro, para que fosse visto pelo maior número possível de banhistas.
No período em que o mastro estava hasteado, um integrante da regional da FUNAI do município de Itaituba (Fundação Nacional do Índio), que passava férias em Alter do Chão, percebeu o monumento e buscou mais informações. A “descoberta” por esse indigenista da FUNAI se deu de forma casual e não oficial, mesmo após a FUNAI de Brasília já ter recebido ofício do povo Borari, em setembro de 2003, reivindicando seu reconhecimento étnico e a regularização fundiária de seu território.
A partir de então, as lideranças Borari, juntamente com esse integrante da FUNAI, iniciaram os processos de identificação e delimitação do território, além da construção de um memorial descritivo com referências nas quais foram tiradas as coordenadas que delimitam o território reivindicado, ilustrado no mapa abaixo, excluindo-se os limites da área urbana da vila de Alter do Chão.
O Cacique Maduro, do povo Borari Alter do Chão, fala que “em 2008 foi feito o estudo da FUNAI de identificação e delimitação do território”. O cacique conta que “desde o governo Lula ainda não saiu o relatório”. Atualmente, segundo informações obtidas com o povo Borari, o relatório tramita no Ministério da Justiça.
A viagem de volta
O processo de auto declaração de pertencimento e demarcação do território feito a partir do levantamento do mastro na praia do cajueiro para mostrar que os Borari sempre viveram no local é conhecido como a “Viagem de volta”, fruto de um processo histórico pelo qual essas populações indígenas passaram e que resultou nas atuais configurações sociais desses grupos étnicos.
Não estão ligadas apenas ao “retorno” às antigas formas de organização social ou à retomada de elementos culturais (rituais religiosos, uso de diacríticos como vestes, pinturas corporais, cordões, pulseiras etc.), mas também se referem ao retorno e retomada da luta pela posse territorial.
Os desafios atuais
Segundo Helvis Borari, morador da vila de Alter do Chão, cerca de 1500 famílias moram no território. Helvis fala também que “indígenas de outros territórios também estão morando no no território Borari”. O povo Borari de Alter do Chão ainda não possui Protocolo de Consulta Prévia Livre e Informada, garantido pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil é signatário. A ausência deste documento facilita também a entrada de pessoas não indígenas ao território, colocando em risco a cultura e a vida dos nativos que resistem nesse território tão cobiçado.
A gentrificação
Diante da quantidade novos moradores que chegam à Alter, Helvis conta que tem medo dos indígenas perderem os territórios. “É muita gente chegando, as pessoas vão chegando e ocupando as terras, e daqui a pouco a cultura vai se perdendo. Muda tudo!”.
Helvis fala também que “muitas pessoas que querem comprar terras em Alter do Chão, muitas vezes nem são parentes daqui”. Uma triste realidade contada por Helvis Borari é que "às vezes, por problemas de saúde tem que se desfazer do seu pedaço de terra”.
Alter do Chão há muito tempo deixou de ser uma vila, passou a ser o principal polo turístico da região. Apesar de ser importante para a economia do município de Santarém, o avanço do turismo ocasiona uma série de problemas sociais e ambientais, a começar pela alteração no modo de vida dos povos tradicionais. A frente da vila foi completamente tomada por edificações no que antes eram casas de moradores, hoje degradação ambiental. Além da discriminação e racismo que os indígenas sofrem por quererem viver aos modos de suas culturas.