Terça, 08 de Outubro de 2024
Empate Maquiagem verde

Mais uma falsa solução: Greenwashing da Cargill promete carbono zero na navegação

Enquanto amplia seus investimentos e utiliza de modo repetido o instrumento de maquiagem verde (o chamado greenwashing) para demonstrar seu comprometimento com a sustentabilidade, a empresa segue promovendo de maneira sistemática impactos socioambientais e climáticos na Amazônia.

29/06/2022 às 16h43
Por: Tapajós de Fato Fonte: Tapajós de Fato
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Foto: M'boia
Foto: M'boia

Em junho de 2022, a Cargill lançou relatório de monitoramento da redução de emissões de gases do efeito estufa (GEE) por transporte hidroviário, o principal modo de escoamento da produção graneleira de soja e milho da empresa nos portos de Santarém. No âmbito das discussões climáticas, a utilização de combustíveis fósseis pelo transporte marítimo é alvo de constantes debates. Especialistas têm apontado a urgência dessa problemática e em novo relatório a Cargill aponta sua solução.

Indicando metas de carbono zero previstas no Sea Cargo Charter, acordo voluntário entre empresas de comércio internacional de commodities agrícolas e de combustíveis que prevê redução de 50% de emissões de gases de efeito estufa até 2050, a Cargill mais uma vez apresenta uma estratégia de sustentabilidade questionável: promete a mudança de uso de combustíveis fósseis para biocombustíveis.

Navegando na onda de metas climáticas voluntárias corporativas, a Cargill assinala uma mudança do setor de exportação de soja e milho em um cenário de economia pós-covid, que contém a estimativa de aumento de frota de embarcações e maior velocidade do transporte oceânico. Ou seja, continua com o fomento à ampliação dos campos de monocultivo baseados no uso de agrotóxicos sobre a Amazônia.

Em âmbito nacional, a Cargill indica respeitar acordos corporativos ambientais como a moratória da soja. No entanto, como indicado pela Organização de Direitos Humanos Terra de Direitos, depois de 15 anos do acordo a instalação de empreendimentos violadores de direitos socioambientais presentes no Oeste do Pará – que garantem a estrutura para a produção e escoamento dos grãos (como os portos da Cargill em Santarém e em Itaituba, no Pará) – e a franca expansão da monocultura da soja põem em xeque a sustentabilidade deste acordo.

Possivelmente conectada com o aumento do desmatamento, uma das principais fontes do aumento de emissões de gases de efeito estufa na Amazônia, a empresa propõe compensar em digitalização, monitoramento e mudança da fonte da energia do transporte hidroviário, a poluição causada com a mudança do uso do solo. Outra questão que precisa ser verificada é a cadeia produtiva de biocombustíveis, cujo aumento de demanda pode contribuir para a captura e controle de terras no país.

Com dois portos na bacia hidrográfica do Tapajós em menos de 20 anos, a Cargill pretende construir mais um porto na Amazônia, dessa vez em Abaetetuba. Enquanto amplia seus investimentos e utiliza de modo repetido o instrumento de maquiagem verde (o chamado greenwashing) para demonstrar seu comprometimento com a sustentabilidade, a empresa segue promovendo de maneira sistemática impactos socioambientais e climáticos na Amazônia.  

A conta da falsa solução não fecha: a fachada da descarbonização na navegação esconde mais demanda de produção e transporte pelas rodovias, que colocam os territórios e as comunidades tradicionais da região sob ainda mais pressão pelo uso do solo.

 

Uma responsabilização efetiva, para além de pactos corporativos assinados pelas empresas, deveria ser o cumprimento de regras oficiais de licenciamento ambiental, que podem alcançar também as embarcações. A mitigação dos impactos das mudanças climáticas não deve ser baseada em discursos do marketing verde, o Estado precisa garantir fiscalização e intervenções efetivas.

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